Levar os princípios da permacultura, assentes na sustentabilidade, a zonas precárias, nomeadamente a campos de refugiados, é um dos sonhos de Eunice Neves, arquitecta paisagista, natural de Leiria, que há mais de uma década se apaixonou por esta forma de fazer agricultura sem destruir a natureza. Uma paixão que a levou até à Austrália, onde vive, para aprender com os pioneiros da permacultura.
Actualmente, trabalha numa quinta, localizada no sul do país, a partir da qual tem também colaborado com a sua mentora, Rosemary Morrow, no desenvolvimento de projectos com refugiados em países como a Grécia, Bangladesh, Turquia ou Filipinas.
“Poder levar esperança e empoderamento a pessoas que vivem em zonas precárias é algo que gostava muito de fazer”, confessa Eunice Neves, que nos últimos anos apoiou Rosemary Morrow na concretização de projectos de permacultura em campos de refugiados. “Ela ajudou a redesenhar as condições terríveis em que vivem aquelas pessoas, para que pudessem produzir alguns alimentos e ter água potável. Apoiei à distância com a parte logística”, conta a arquitecta, que tem também trabalhado num projecto que um aluno da sua mentora está a desenvolver no Afeganistão.
Aqui, a missão é “resenhar uma escola”, localizada em “cenário de guerra”, e transformá-la num “modelo de permacultura”, que permita “empoderar a comunidade local”. Também aqui, a colaboração de Eunice Neves é à distância, mas suficientemente próxima para alimentar a vontade de ir mais além.
Nascida em Leiria, Eunice Neves licenciou-se em Arquitectura Paisagista pela Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (2001- 2007), tendo feito o estágio na Holanda. Em 2009, foi para o Nepal como voluntária para trabalhar numa aldeia ecológica que acolhe crianças órfãs, uma experiência que mudou a sua percepção[LER_MAIS] do mundo e da sua profissão, apresentando-a à permacultura.
“Vim cheia de entusiasmo com a filosofia e estilo de vida que descobri, assente na vivência em harmonia com a natureza e em função das necessidades do dia a dia”. De volta a Portugal, esteve por quatro anos a aprofundar conhecimentos e experiências na área da permacultura e sustentabilidade.
Foi também durante esta fase que conheceu a sua mentora, com quem fez dois cursos de formação no Algarve. Em 2015, partiu numa viagem de investigação de 15 meses, financiada por crowdfunding, para observar projectos de permacultura na Austrália e nos EUA, e, dessa forma, validar o que aprendera.
“Queria conhecer novas abordagens de planeamento, vendo com os meus olhos”, explica. Durante a viagem, viveu e trabalhou com vários especialistas em permacultura, estudando os seus projectos a fundo, no sentido de partilhar a sua sabedoria com as gerações mais jovens. Sobre todos eles produziu relatórios, que disponibilizou on-line e dos quais resultará também um livro, que deverá ficar concluído em breve, como contrapartida pelo apoio que recebeu através do crowdfunding.
Presentemente, vive numa quinta, com cerca de 20 hectares, localizada perto de Adelaide, no Sul da Austrália, onde se procura “imitar a natureza” e fazer da sustentabilidade o eixo central de todo o desenho do espaço. “Em vez da monocultura, aposta-se na policultura, com há mais de 100 variedades de árvores de fruto. Produzem-se ainda oito espécies de frutos secos, com destaque para o pistácio. Não se usam químicos que sejam danosos para a biodiversidade das espécies e para os aquíferos”, descreve Eunice Neves.
A quinta, propriedade de Annemarie e Graham Brookman, dispõe ainda de um centro de formação sustentável e é palco de workshops de permacultura, dias abertos e visitas guiadas para a comunidade, escolas, empresas e universidades e recebe voluntários de todo o mundo. Em parceria com uma designer de permacultura americana Sara Wuerstle, Eunice Neves tem também uma empresa, a Guilda Permaculture, que se dedica à formação nesta área.
“Não há nada mais sustentável e resiliente do que os ecossistemas naturais. Temos de olhar para eles e imitá-los, retirando daí princípios para redesenhar os sistemas humanos. Não podemos continuar a fazer erros. A natureza não nos perdoará”, defende a Eunice Neves, que sonha também em criar um centro de sustentabilidade em Leiria.