Chamou a si os pelouros da Gestão Financeira, Desenvolvimento Económico e Natural, Recursos Humanos, Turismo e Desenvolvimento Comunitário. Isto mostra as prioridades do presidente para o seu município?
As prioridades do presidente são todas as áreas, mas, acima de tudo, a Saúde, a dimensão social e o desenvolvimento económico. Estes são os temas de maior incidência e mais estruturantes para o concelho. Confio na equipa do executivo e algumas destas áreas estão com os vereadores, mas isso não quer dizer que são menos importantes.
Um dos seus pelouros é o Turismo e a marca Óbidos é muito conhecida dentro e fora de fronteiras.
Em Óbidos, as duas áreas que se destacam são a agricultura e o turismo. No caso desta última, com a pandemia, ficou demonstrado que não podemos apostar apenas em eventos de massas ou da concepção que deles tínhamos. Estamos a trabalhar numa estratégia de diversificação, em turismo inclusivo, de natureza, religioso, militar, entre outras áreas que pretendemos dinamizar. Durante este período de pandemia, tivemos uma procura acima do que seria expectável, por sermos um território ainda rural. Não é um turismo com o impacto de urbanidade que os jovens costumam procurar, mas as famílias e os jovens que se estão a estabelecer em empresas que exigem um trabalho bastante stressante e intenso, têm necessidade de escapes e de se livrar da máscara em ambiente seguro. Temos um território com potencial para desenvolver esse campo. Também temos o turismo de património e cultural. Há aqui aldeias que também têm história, raízes e tradições, que estão pouco aproveitadas e queremos promovê-las dentro da marca Óbidos. Temos até a cidade romana de Eburobritium.
Quando tomou posse, anunciou que pretendia que Óbidos acolhesse mais dois ou três eventos que projectassem a marca “além-fronteiras”. Como está esse processo?
Quando fomos eleitos não fizemos promessas de nada, a não ser trabalhar durante o nosso mandato. Mesmo assim, temos um projecto a dez anos – apesar de estarmos mandatados apenas para quatro – com um conjunto de intenções, nomeadamente, consolidar e fazer o rebranding dos eventos que acontecem em Óbidos, alguns há 20 anos, como o Mercado Medieval ou o Festival Internacional do Chocolate. E outros mais recentes, como o Folio ou o Vila-Natal. Queremos dar uma nova roupagem a estes eventos. Começámos por tirá-los da cerca do castelo e a dispersá-los por toda a vila. No futuro, queremos que as freguesias e aldeias dêem também um contributo. Promoveremos todo o concelho, mostrando o que temos de património cultural e tradicional. Além deste rebranding, temos pensados três eventos que gostaríamos de fazer. Pretendemos organizar já este ano, em Setembro, um evento de gamming, programação e gadgets. É um sonho antigo que casa muito bem com o Parque de Tecnologia e Ciência e a promoção desse espaço. Outro evento, será uma feira agrotecnológica, com inovação de ponta, com equipamentos a trabalhar in loco. Temos a aplicação mais visível no sector das fruteiras, mas também temos as hortícolas e a vinha. Por fim, queremos um evento ligado ao cinema e à moda, que terá mais glamour. Entre os dias 21 e 24 de Abril, vamos ressuscitar o festival Latitudes, um evento literário de viagens e viajantes. Esta é uma estratégia que, além de notoriedade, traz pessoas a conhecer a vila e que, naturalmente, poderão ficar mais dias, nos alojamentos ou a usufruir dos restaurantes. Queremos que Óbidos seja um destino de permanência e não apenas de passagem. Se as pessoas gostarem, poderão até ajudar no aumento da densidade populacional que temos sentido nos últimos dez anos.
O seu vizinho de Caldas da Rainha, Vítor Marques, defende a necessidade de ambos os municípios colaborarem em projectos estruturantes comuns. A revisão do PDM, do lado das Caldas, prevê o investimento, por exemplo, num parque industrial na fronteira concelhia. Qual é a posição de Óbidos?
Temos um bom relacionamento. Sempre me fez sentido criar pontes e nunca muros. No seguimento de uma reunião intermunicipal, lançámos o desafio de, para ganharmos massa, desenvolvermos projectos comuns. Durante a campanha eleitoral, ouvimos muitas vezes dizer que as empresas precisavam de complementariedade. Com o presidente de Caldas, falámos em criar uma zona industrial comum e delimitámos uma área com cerca de 100 hectares, que até tem um pouco mais de espaço no concelho de Óbidos, para que pudéssemos criar um pólo que não fosse distintivo entre concelhos e convergisse numa estratégia comum para a região. Temos outro projecto, que é a exploração da Lagoa de Óbidos, que é comum aos dois municípios. Do ponto de vista do turismo é algo que devemos explorar, entre outros projectos que virão no futuro. Temos um acordo de cavalheiros. Para mim, vale tanto quanto um documento assinado.
As empresas que pretendem para essa nova zona serão de tecnologia e startups?
Pretendemos abrir o espaço para que venham essas empresas. Temos de ter a capacidade de atrair novas empresas e a capacidade de os albergar. Óbidos tem tido essa lacuna e estamos a tentar dinamizar uma estratégia local de habitação.
Outro problema comum é o novo hospital do Oeste. Já se sabe o resultado do estudo de avaliação?
Prevê-se que as conclusões desse estudo, que está a ser conduzido pela Universidade Nova de Lisboa, e o local onde o hospital será construído serão anunciadas em Setembro. Fomos auscultados e, com Caldas, vimos uma solução dividida entre os dois concelhos. Seria uma área que se estenderia desde as traseiras da Escola de Sargentos do Exército das Caldas da Rainha e que chega ao nó da A8, em Óbidos. São cerca de 60 hectares, dos quais 34 serão no nosso concelho e 26 no de Caldas. Estaria implantado junto à Linha do Oeste, estratégico para a descarbonização e mobilidade, mas também com ligação à A8, à A15, à A1 e à A21.
A unidade serviria o Oeste, mas também os concelhos a sul de Leiria e parte do distrito de Santarém?
Precisamente.
A falta de médicos no concelho de Óbidos já está regularizada?
Está longe de o estar. Estamos a tentar outras formas para resolver o problema, através de inovação tecnológica. O problema é comum no País, em especial no Centro e Sul. Temos necessidade de sete clínicos e só temos dois, além do especial favor que nos está a fazer o doutor Fernando Correia, ao abrigo de um protocolo com uma IPSS, que faz mais 14 horas. Mesmo assim, estamos a assegurar médico de família a apenas cerca de 45% da população.

Há três médicos para 11.800 pessoas?
Exactamente. Temos mais de cinco mil pessoas sem médico de família. É muito preocupante.
Sem cuidados de saúde assegurados, é difícil convencer nova população a fixar-se…
Com este modelo, é muito difícil. Naturalmente, terão de vir privados e de haver parcerias que estimulem jovens médicos, dos 30 aos 40 anos, a fixarem-se ou a envolverem-se. O actual sistema não motiva, está gasto, é muito pesado para os clínicos. E com a pan- demia ainda a decorrer, apesar de haver mais liberdade, temos um conjunto de sequelas que têm de ser sanadas. Por exemplo, a parte mental está muito desgastada, e vemos isso nas famílias e nos colaboradores.
O concelho tem uma população envelhecida?
Sim, muito. Estamos num território onde a pirâmide demográfica está muito invertida. Do ponto de vista do apoio à natalidade, estávamos bem posicionados e decidimos aumentar esse apoio. Estamos a tentar perceber o tipo de serviços que vamos apoiar, se as vacinas, se a puericultura, se outra área importante para os jovens pais. Faz falta ter mais incentivos à natalidade para tentar inverter esta tendência. Trabalhar atrás de um computador é fácil e tanto se faz em Lisboa ou em Óbidos. Temos a oportunidade de desenvolver essa estratégia de captação dos nómadas digitais e de criativos, sendo que Óbidos é um território inspirador, como nos dizemmuitos dos que nos visitam.
Quando a requalificação da Linha do Oeste estiver terminada, pelo menos até às Caldas, acredita que haverá utilizadores para os comboios?
Penso que, face ao investimento que está alocado à requalificação da Linha do Oeste, o ganho é pouco. São poucos minutos…. O facto de estes 150 milhões de euros irem traduzir-se em apenas oito a 12 minutos numa viagem, não é significativo. Mais importante e o que realmente nos interessava, era que a Linha do Oeste tivesse uma extensão até Coimbra. Isso faria verdadeira diferença na questão do turismo, da descarbonização e da mobilidade entre regiões.
Quando tomou posse, disse ter sentido que os municípios envolvidos na Rede Cultura 2027 cada um puxava para si, em vez de trabalharem em prol do objectivo. Entretanto a candidatura caiu, mas ficou a Rede Cultura. Acredita que a iniciativa ainda irá conseguir concretizar algo?
Espero que sim. O trabalho estava bem preparado e consolidado. Do ponto de vista cultural, temos, de facto, de ter uma oferta mais efectiva. Óbidos também tem de ter essa oferta cultural. Para as pessoas de uma grande metrópole, como Lisboa, há procura de espectáculos como a ópera, como um festival de piano como a nossa Semana Internacionao de Piano de Óbidos, que ligam bem com uma vila como Óbidos. Espero que a Rede Cultura se mantenha e que possamos dar notoriedade e visibilidade aos bons intervenientes que temos na nossa região e no nosso concelho. Ainda ontem, tivemos um concerto com a Sinfonieta e com o coro Alma Nova digno de ser gravado e de ser passado em televisão. É uma cultura que liga bem com este tipo de património e as pessoas saem muito agradadas. Só espero que, mais do que a Rede Cultura se mantenha, que ela se galvanize e contagie.
Como está a decorrer o desassoreamento da Lagoa de Óbidos?
O investimento de cerca de 14 milhões de euros foi finalizado em tempo recorde. Isso também se deve ao facto de a draga ser de última geração e de ter uma capacidade de sucção acima da média. Foi um trabalho notável, bem pensado, bem informado, mas que ainda precisa de outra intervenção. A zona inferior da lagoa, mais próxima da aberta contém muitos sedimentos trazidos pelo mar, tal como a coroa do Arim, que é uma área intermédia entre os braços superior e inferior, que pode ser um viveiro de bivalves, que os mariscadores podem utilizar e ganhar o seu sustento, ou ainda a zona junto à Poça da Ferraria. Estamos, junto com Caldas da Rainha, a fazer pressão junto da Agência Portuguesa do Ambiente para não estarmos a esperar mais cinco ou seis anos por esta intervenção. O dinheiro dos contribuintes deve ser respeitado e, por isso, a zona da aberta deve ser delimitada, para que não fique a deslizar ao sabor das marés e da hidrodinâmica da lagoa. Se não, vamos ter, a cada quatro ou cinco anos, a necessidade de fazer novo investimento avultado.
Filho e amante da terra, Filipe Daniel, 41 anos, eleito pelo PSD, é engenheiro agrónomo.
Foi dirigente associativo e é empresário, tendo criado, em 2017, a Alcóbidos Lda., projecto pessoal de produção e industrialização de bebidas espirituosas e licorosas.
Foi presidente da Associação de Beneficiários do Aproveitamento Hidroagrícola de Óbidos, foi líder da bancada do Partido Social Democrata na Assembleia Municipal de Óbidos, entre 2017 e 2021, e, desde 2021, presidente a Comissão Política Concelhia de Óbidos do PSD.