O sino da Igreja da Vestiaria, no concelho de Alcobaça, foi furtado na madrugada de 9 de Setembro, para indignação da comunidade, que celebrava o dia da padroeira.
Na madrugada de 5 de Setembro, tinha sucedido o mesmo na Capela de Vale de Água, em Porto de Mós. No mesmo concelho, também recentemente, foram furtadas panelas, tachos e talheres da cozinha de apoio à Capela de Casais Garridos e foi ainda danificada uma porta na Capela de Chão Pardo, numa tentativa gorada de arrombamento, explica ao JORNAL DE LEIRIA António Cardoso, pároco de Pedreiras e Juncal.
Mais do que inseguras e revoltadas com a perda de um património que a todos pertence, as populações sentem-se “feridas” com a usurpação de símbolos que marcam os seus momentos de felicidade, de dor e religiosidade.
Em quase oito anos de mandato, Isabel Costa, presidente da União de Freguesias de Alcobaça e Vestiaria não se recorda de uma situação semelhante neste território. O sino da Igreja de Vestiaria foi furtado pelas 3 horas da manhã, quando se comemorava o dia da padroeira, Nossa Senhora da Ajuda. “Um morador ouviu grande estrondo e dirigiu-se ao local. Ainda se afastou de um carro, que quase o atropelou. Mais tarde, percebeu-se que faltava o sino de bronze”, conta a presidente, acrescentado que “o caso foi reportado às autoridades”.
“As pessoas estão revoltadas e tristes, sobretudo porque era um dia especial, da padroeira”, sublinha a autarca. O prejuízo, conta Isabel Costa, será de três a cinco mil euros. Na Capela de Vale de Água, o sino [LER_MAIS]terá sido puxado com tanta força, talvez com cabos de aço, supõe o pároco António Cardoso, que levou à queda de uma parte da torre. Só o sino, estima o padre, custaria cerca de quatro mil euros. Mas há também que reparar a parte caída do edifício. “Há um misto de revolta, de tristeza e de insegurança num lugar pequeno”, onde não são comuns situações do género.
A última vez que aconteceu caso idêntico foi em 2019, em Pedreiras, mas foi possível recuperar os bens furtados, conta António Cardoso.
Arlindo Jerónimo, sócio-gerente da única fundição de sinos activa no País, situada em Braga, explica que é habitual ser contactado pela GNR, que solicita informação a fim de conseguir avaliar o valor destas peças e, assim, estimar os prejuízos causados. “Há dois anos também ouvi falar de alguns furtos”, recorda o empresário.
“Um quilo de ferro custa cerca de 70 cêntimos e um quilo de bronze custa cerca de 25 euros”, razão pela qual se tornam peças apetecíveis, explica Arlindo Jerónimo. O empresário acredita que o objectivo de quem furta é vender a sucateiros de Portugal e de Espanha. Também o próprio já foi abordado com ofertas de sinos. “Há um ou outro que tenta vender. Se suspeitamos da proveniência não compramos.”
O JORNAL DE LEIRIA contactou a GNR acerca dos furtos, mas não foi possível obter resposta até ao final desta edição.
“Ferida” aberta na comunidade
Maria Adelaide Furtado, campanóloga e investigadora da arte sineira em Alvaiázere, explica que este tipo de crime costuma ser cíclico, sendo que os sinos acabam por ser refundidos. “Com eles desaparece informação útil e parte da história local”. Recorda, por exemplo, que há cerca de seis anos foram furtados dois sinos em Pelmá (Alvaiázere), que tinham sido produzidos na emblemática Fundição de Sinos da Boca da Mata, constituída naquele concelho em 1899 e que, durante 70 anos, fabricou destas peças de arte para todo o mundo.
O sino da Capela da Serra, nos Covões, também foi um daqueles que foi furtado há meia dúzia de anos em Alvaiázere, recorda a especialista.
“Sempre que tenho oportunidade, falo aos párocos da necessidade de colocarem redes ou grades à volta dos sinos, sobretudo quando as igrejas e capelas estão isoladas e as torres são baixas”, salienta.
“A maioria dos sinos são comprados com o apoio da população. Fazem parte da sua história, do seu quotidiano. Quando os furtam, as pessoas ficam muito feridas. São os sons que os acompanham nos casamentos, nos baptizados, nos funerais e em tantas outras cerimónias religiosas”, constata a campanóloga.