Uma “lição de vida” é como o padre David Ferreira encara os mais de 11 anos que leva de vida missionária em Angola, integrado na missão da diocese de Leiria-Fátima no Gungo que, ao longo dos anos, se tem revelado “uma presença transformadora”.
Nascido em França, filho de emigrantes naturais de São Simão de Litém, no concelho Pombal, David Ferreira entrou no Seminário de Leiria aos 11 anos. Desfeitas as “dúvidas normais” que o processo de discernimento vocacional envolve, ordenou-se em 2001.
Antes, ainda teve uma breve experiência missionária em Angola, longe de imaginar que mais de metade da sua vida religiosa seria passada em África, a ajudar quem mais precisa.
Após a ordenação, David Ferreira foi colocado na paróquia de Marrazes, em Leiria. Era aí que estava quando, em 2006, a diocese celebrou um acordo de geminação com a sua congénere do Sumbe, que implicava ter uma equipa missionária no Gungo.
“Era preciso alguém e eu disponibilizei-me, ainda tocado pela experiência anterior”, conta o sacerdote que, em 2012, regressou a Portugal, para servir como pároco em Monte Real. Mas o “bichinho por Angola fica sempre”.
De tal forma que, quando em 2016 foi necessário um novo padre para a missão no Gungo, David Ferreira voltou a aceitar o desafio. “Este trabalho só se consegue fazer gostando muito. Fica-se agarrado”, diz, confessando que o que mais o tem prendido a Angola é a vontade de ajudar e a percepção de que o grupo missionário “tem sido uma presença transformadora”, ajudando a “mudar e a melhorar” e até a salvar vidas.
Em 16 anos de actividade são vários os projectos e as iniciativas do grupo missionário Ondjoyetu – que em umbundo, a língua que se fala no Gungo, significa “A Nossa Casa” – tem desenvolvido em prol da população local, “entregue à sua sorte”.
“Na comuna do Gungo residem cerca de 34 mil pessoas e não há um médico ou um enfermeiro. Só alguns técnicos de saúde, com o 6º ou o 10º anos de escolaridade, com formação em cuidados de enfermagem”, exemplifica o sacerdote.
A missão dinamiza também uma ‘escola de líderes’, com o objectivo de ter em cada bairro alguém que receba formação ao nível de cuidados de higiene, saúde da mulher ou tratamento de água.
“Aposta-se no esclarecimento comunitário para mudar vidas”, frisa David Nogueira, sublinhando que na missão “não se fazem projectos ‘chave na mão’, mas sempre envolvendo as pessoas”. Foi dessa forma que, por exemplo, se construiu o edifício da moagem em que “cada pai de famí- lia contribuiu com dois dias de trabalho”.
Também o serviço de camião, que ajuda os agricultores a escoar os seus produtos e faz chegar os bens de primeira necessidade à missão, funciona na mesma lógica.
“O motorista é um habitante local, a quem demos a carta de condução e formação em mecânica e as pessoas dão um pequeno contributo pelo uso do serviço, para que este possa ser auto-sustentável”, explica o sacerdote, adiantando que na missão funciona ainda uma loja solidária, com bens de primeira necessidade, onde se inclui o combustível e artigos de higiene, uma oficina de motorizadas e serviço de fotocópias.
“Há muitas angolas nesta Angola. A realidade do povo simples é que, se não tiverem alguém que as ajude, as pessoas estão sempre entregues à sua sorte. Mas, no meio de tanta dificuldade, conseguem sempre encontrar alegria e esperança.”