Sendo um País pequeno, Portugal sempre lutou contra a concentração de poderes num só local, nomeadamente na sua capital. Todos os cidadãos de um país têm uma relação amor-ódio com as suas capitais, o que tem uma razão de ser.
Muitas vezes as relações estabelecidas estão inquinadas por uma sobranceria citadina versus um complexo de inferioridade/deficit de atenção regional. Penso que esta é uma fórmula que podemos reconhecer como sendo de todos, mesmo que seja complicado admiti-lo.
Posto isto, acho que essa “fricção” é uma das chaves do desenvolvimento local, no que toca ao âmbito cultural. Competir enquanto alternativa às grandes cidades é uma coisa boa que pouco ou nada tem a ver com o ressentimento “provinciano" que os líderes de opinião lisboeta invocam quando beliscados na sua hegemonia urbana.
Em Portugal há muita gente que se acha mente aberta, apenas pelo facto de conhecer mil e uma coisas e de poder participar nas suas géneses. Há uma obsessão pela novidade, que é boa, mas que tem toldado a visão de muita gente que é paga pela sua opinião e a usa para ajustar contas que nem sequer são suas.
Este “combate”, que às vezes faz faísca, é bom e é o que nos permite dar combustão às palavras e aos actos. Estamos chegados a um ponto em que muitos dos melhores talentos da capital de lá saíram por diversas razões.
[LER_MAIS] Pioneiros no êxodo cultural como Paulo Ribeiro/Teatro Viriato (Viseu), João Brites/O Bando (Palmela); resistentes locais como Julieta Aurora Santos/Teatro do Mar (Sines) e o “nosso” João Lázaro no Teato; novos dinamizadores fora da órbita da capital. O melhor programador do País é de Leiria (Carlos Matos).
São muitos os valores que se têm simplesmente afastado de Lisboa por razões que todos devíamos considerar. Eu saí de Lisboa por escolha própria, tal como tantos dos nomes aqui citados.
Não estamos propriamente zangados, nem fomos expulsos pela ditadura do gosto, dos media, dos jornais, da Madonna. Para muitos foi uma escolha em nome da transformação, e não demos nenhum passo atrás para dar dois em frente.
É verdade que quando se sai de Lisboa se desaparece do mapa. É verdade que muita gente levou o seu pontapé nos dentes ou no rabo.
Mas vamos por um momento pensar que muita gente também quis reescrever as suas coordenadas e histórias, optando por influenciar o seu meio cultural em vez de ser mais um de mão estendida, de cortejar inteligências que afinal são tão ou mais “limitadas” que nós.
É a todos os que desapareceram do mapa, para depois ressurgir noutro sítio por escolha e conta própria, a quem dedico este singelo artigo.
*Músico