O InMusic começou como um ciclo de conversas, em formato de tertúlia, entre o público e alguns dos grandes nomes actuais da música clássica nacional. Aos músicos é pedido que toquem e desmontem as peças musicais, permitindo ao público entender o que acabam de escutar.
fundo, é uma espécie de concerto didáctico, onde 50 por cento do encontro é preenchido com música e o restante com uma conversa. Na sua génese, estava uma iniciativa despretensiosa, imaginada pelo também músico Mickael Faustino, 29 anos, para promover a música na sua cidade-natal.
Mas o InMusic cresceu e devido à pandemia de Covid- 19 adaptou o seu formato, passou a ser o InMusic em Casa.
A mudança correu tão bem que vai ser transformado em série televisiva, com oito episódios e passagem na RTP2.
“Não temos uma data definida, mas tudo aponta para a emissão em Agosto”, diz o promotor do InMusic.
Mudar do palco do Teatro Miguel Franco, de Leiria, para o ecrã de televisão implicou também algumas mudanças. Por exemplo, não haverá uma tertúlia, pois, para respeitar o distanciamento físico e as recomendações da Direcção-Geral de Saúde, o público ficou de fora.
As sessões, porém, continuarão a ser conduzidas por Mickael Faustino. Embora cinco dos oito episódios sejam sobre música clássica erudita, Faustino adianta que foi desejo da RTP estender o formato a outros estilos musicais.
“Tenho de admitir que, no início, engelhei o nariz a essa ideia da RTP, mas gostei muito quando vi o resultado. Haverá ainda convidados ligados à guitarra portuguesa, à guitarra eléctrica e à música electrónica.
Do Miguel Franco para a RTP2
O InMusic começou por ser uma série mensal de entrevistas e performances periódicas nos equipamentos municipais de Leiria. “Os convidados são solistas internacionais, músicos portugueses e figuras ímpares das orquestras e grandes referências mundiais que abordam as suas carreiras numa conversa informal com recital”, explica o promotor.
O ciclo chegou ao pequeno ecrã após, por força da pandemia de Covid-19, se ter transformado em webseries, no Youtube e na RTP Play.
“Quando passou para a internet, cresceu muito, foi visto por muitas pessoas e tornou-se conhecido, no meio musical. Acredito que, no meio da música clássica, toda a gente conhece o programa.”
Faustino explica que as razões, para a popularidade, são simples. Até hoje, sublinha, não houve na televisão ou nos canais de divulgação audiovisual, um programa onde os músicos falassem da sua vida, do seu trabalho e das suas carreiras.
O músico acredita ainda que a passagem do InMusic pela RTP vai ser boa para a imagem de Leiria e para a iniciativa Leiria Cidade Criativa da Música da Unesco de que a rubrica musical começou a ser parceira.
“Entretanto, vai começar a ser realizado noutras cidades, porém, não vamos esquecer que foi em Leiria que tudo começou.” É, pois, assim que, em Outubro, o ciclo de conversas sobre música erudita terá quatro sessões em Vila Franca de Xira, cidade que acolhe a primeira aventura fora de Leiria.
“O formato vai ser o mesmo, mas acontece em quatro domingos seguidos, ao contrário de Leiria, onde é apenas uma vez por mês.” Na cidade do Lis, as sessões ao vivo vão continuar, sempre com cuidados redobrados, segurança e distanciamento físico.
O município renovou para mais sete sessões, de Novembro de 2020 a Maio de 2021. E não está fechada a possibilidade de haver emissões em streaming. A aposta agora, é a subida de fasquia e chegar à música de câmara. Duos e quartetos estão na mira de Mickael Faustino que, quer dar a conhecer como é tocar em conjuntos na música clássica, pela voz dos próprios músicos.
Os episódios na RTP também alargaram os horizontes musicais do InMusic ao vivo. Em breve, por exemplo, haverá uma sessão sobre Jazz, que terá o leiriense Eduardo Cardinho, como convidado e, para Setembro, o promotor sugere Inês Vaz, acordeonista que já tocou como solista com a Orquestra Gulbenkian e Camerata Atlântica, que irá dar a conhecer a sua música e carreira.
Quem não quiser esperar, pode sempre ver, no canal Youtube do InMusic, os episódios com Nuno Inácio, primeiro flautista da Orquestra Metropolitana de Lisboa, ou com Carolina Coimbra, harpista e professora da Escola Superior de Música de Lisboa.
Visto em 32 países
Nos meses de confinamento, as sessões emitidas online foram muito concorridas. Criou-se um grupo de fãs nacional e, quase sem dar por isso, o jovem promotor viu o InMusic conquistar também melómanos estrangeiros.
“Achávamos que íamos estar um mês e meio sem concertos e que isso nos iria desmotivar. Acabou por ser mais tempo… e lembrei-me de criar um programa em formato de internet. Procurei algo online, que correspondesse àquilo que eu queria, mas só encontrei um vídeo.”
Essa ausência fez com que Mickael começasse a matutar. Se pedisse aos amigos músicos e colegas de formações musicais, para participarem com um vídeo poderia chegar a muitas pessoas.
Foi assim que apareceu a InMusic Academy, para onde mais de 100 músicos deram o seu contributo e enviaram um vídeo mostrando o seu aquecimento, com dicas e motivação para outros artistas.
“Neste momento, o InMusic foi visto em 32 países e temos vídeos de 29 países. Hoje, quase toda a gente do mundo da música clássica, em Portugal, sabe o que é e o que fazemos”, diz com orgulho.
E embora a Covid-19 esteja a ser um problema grave, que colocou os músicos em risco de subsistência, Mickael não deixa de ver um aspecto positivo [LER_MAIS]na pandemia, por ter feito com que as pessoas se aproximassem e se unissem, esquecendo as “lutas constantes por apoios públicos”.
“Acredito que o InMusic teve um pequeno papel nessa aproximação. Fizemos lives onde juntámos músicos de todo o País. Por exemplo, os tubistas nunca tinham falado em conjunto. Não vou dizer que uni a classe, mas acho que estão mais próximos, agora. E é união que falta.”
Os melhores músicos portugueses Não se sente à vontade a ver-se em vídeo, a conduzir entrevistas, e se, há um ano, lhe dissessem que iria acontecer, Mickael Faustino iria rir-se perante um cenário que lhe parecia absurdo.
Ao fim de 60 episódios, continua a ser uma grande aventura e um motivo de orgulho. “Temos ali os melhores músicos portugueses e quase nenhum rejeitou o meu convite para participar.”
Mesmo a um músico como Mickael, que já tocou com a Gustav Mahler Jugend Orchester, Schleswig Holstein Orchester Academy, The World Orchestras ou com as orquestras Gulbenkian e da Casa da Música, as conversas trouxeram algumas surpresas e grandes ensinamentos de vida.
“Quando vemos um músico a tocar na Orquestra de Berlim, sempre sorridente e a ganhar prémios, não vemos o outro lado do quotidiano, o lado mau, os sacrifícios e os obstáculos que é preciso ultrapassar. Vemos o sorriso e não percebemos que as pessoas podem não estar bem. Na música, há muitas pessoas a passar por isso. Os momentos maus também devem ser partilhados para percebermos que até os melhores do mundo têm as suas falhas, que é possível ultrapassá-las e, que no final, conseguimos rir-nos disso.”
Mickael e a trompa
O InMusic nasceu na cabeça de Mickael Faustino em 2018. Em Março desse ano, fez duas sessões experimentais, com Hugo Assunção, professor na Escola Superior de Lisboa, e com o premiado tubista de Alcobaça Sérgio Carolino, no Teatro Miguel Franco, em Leiria, para perceber se o formato tinha viabilidade.
“Foi a partir de uma conversa com o então vereador do Pelouro da Cultura de Leiria, Gonçalo Lopes, hoje presidente da Câmara. Estávamos a falar das pessoas do meio artístico e musical e dos artistas que eu conhecia e chegámos à conclusão que seria interessante trazer a Leiria músicos e professores conceituados, para falarem do seu trabalho em pequenas conferências musicais”, recorda.
Em Novembro desse ano, começou uma série de seis sessões, que recebeu, entre outros, Pedro Neves, maestro dirige as orquestras Gulbenkian, Metropolitana e da Casa da Música, tendo encerrado com o Miguel Franco cheio, para ouvir o maestro Victorino de Almeida falar da sua vida e da sua música.
Natural das Cortes, Leiria, Mickael Faustino iniciou-se no mundo da música na banda da Filarmónica das Cortes, Leiria. Concluiu a licenciatura na Esmae, no Porto, e, de lá, seguiu para o mestrado na Hochschule für Musik und Theater, em Lepzig.
O trompista integrou algumas das mais prestigiadas orquestras de jovens do mundo como a Gustav Mahler Jugend Orchester, Schleswig Holstein Orchester Academy ou The World Orchestra.
Regressou a Portugal e, em Leiria, deu aulas nas bandas filarmónicas da região, além de ter vários projectos musicais e de ser músico nas orquestras Gulbenkian e da Casa da Música.
Também é da sua autoria o espectáculo A Trompa e a Disney, que passou no Teatro José Lúcio da Silva, em Leiria, e juntou bandas de rock da cidade, o coro do Ateneu e a escola de ballet Staccato.