O director da Leiria Cidade Criativa da Música não esconde o entusiasmo quando fala de “Everything In Its Right Place”, canção dos Radiohead a que acaba de emprestar novas possibilidades. “De repente, explode e o tempo acelera rapidamente e vamos para uma cena meio drum and bass a abrir e com muito mais acordes, e portanto, a partir daí, digamos que é Daniel Bernardes puro e duro”.
“Everything In Its Right Place” é um dos temas favoritos do pianista e compositor natural de Alcobaça, de uma banda com que se relaciona desde a adolescência. “O que acho que eles conseguem fazer de forma brilhante é associar uma carga emocional muito forte a uma carga intelectual também ela muito estimulante”. E mais: a capacidade de “saírem de sonoridades menos óbvias e menos quadradas em termos rítmicos e harmónicos” e entrarem por outras que são mais frequentes “no contexto jazzístico, ou, pelo menos, de uma certa sofisticação”.
Os Radiohead vão voltar? Os fãs agitam-se com a notícia de uma nova sociedade comercial constituída este mês pelos cinco músicos, que estiveram juntos em digressão pela última vez no ano de 2018 (o álbum mais recente, A Moon Shaped Pool, é de 2016). Mas, enquanto Thom Yorke e os restantes membros do grupo não confirmam o regresso, a Orquestra de Jazz de Espinho, acompanhada pelo guitarrista Mário Delgado, prepara-se para tocar oito temas da banda a partir de arranjos de oito compositores, entre eles, Daniel Bernardes e Estela Alexandre, antigos alunos do Orfeão de Leiria. Há três datas agendadas já neste fim-de-semana: 28 e 30 de Março no Auditório de Espinho, 29 de Março na Casa das Artes de Famalicão.
Não é a primeira vez que a vencedora do Concurso Internacional de Composição de Leiria na categoria jazz (em duas edições) se aventura a redesenhar obras do território do rock – anteriormente, fez arranjos, por exemplo, para temas de Ornatos Violeta. “A visão da música vai sendo sempre renovada”, assinala Estela Alexandre. “Foi pensada pelos autores, passa por um processo de arranjo e depois passa para as orquestras. Várias vozes, que podem adicionar várias interpretações”. No caso dos Radiohead, coube-lhe em sorte “Jigsaw Falling Into Place”. O mais interessante? “O facto de ser um tema em que não sei bem decifrar um refrão. Há uma ideia contínua que vai sendo desenvolvida. É um tema meio estático, não o sendo”.
O espectáculo Radiohead Recomposed tem direcção musical de Paulo Perfeito e do vibrafonista Eduardo Cardinho, outro antigo aluno do Orfeão de Leiria, que explica que a Orquestra de Jazz de Espinho não é conhecida por tocar standards e swing, pelo contrário. “É o oposto. É uma orquestra bastante moderna e com este projecto estamos a tentar chegar a mais pessoas”.
Em palco, serão quase 20 músicos, com vários instrumentistas de sopros. “Vai soar bastante a Radiohead”, mas em formato de big band. E “vai ser rockeiro”, antecipa Eduardo Cardinho, que elogia as “cores”, “texturas” e “efeitos” que o colectivo originário do sul de Inglaterra consegue entregar de disco para disco. “Admiro muito o facto de eles criarem música tão complexa e ao mesmo tão acessível a toda a gente”.
Em Radiohead Recomposed participam como arranjadores Daniel Bernardes, Carlos Azevedo, Telmo Marques, Nazaré da Silva, José Pedro Coelho, Estela Alexandre, Johannes Krieger e Paulo Perfeito. Em Maio, o espectáculo será apresentado em Faro e no mês de Junho vai integrar o programa do Festival de Jazz de Tomar.