Como começou esta aventura do Dakar?
Todos os pilotos de todo-o-terreno têm a ambição de um dia participar na prova mais difícil no mundo, o Dakar. E confesso que, ao longo dos anos, pensava sempre: um dia espero ter o prazer de a fazer. Ao longo deste ano, com os testes e a prova que fomos fazer no rali de Marrocos com o Yamaha, achei que podia haver uma oportunidade e ser mais fácil para a minha aprendizagem. No início não estávamos com vontade, mas no final do ano, depois do rali de Marrocos, achámos que seria interessante encarar esta aventura. Correu bem. O objectivo era chegar ao fim e divertir-nos todos os dias, o que foi concretizado. Ainda tivemos alguns bónus, como uma vitória em etapas, dois segundos lugares e dois terceiros lugares. Portanto, o balanço foi bastante positivo.
Houve peripécias ou algum susto?
Por acaso tivemos um rali limpo, sem qualquer susto. Tivemos alguns problemas mecânicos, mas é mesmo assim. E a experiência foi incrível. Assisto ao Dakar há 15 anos na televisão. Passados tantos anos, estar presente nesta aventura, no meio dos melhores pilotos do mundo, é um sonho tornado realidade. Senti-me muitíssimo bem durante esses 15 dias. Na primeira semana os resultados não foram os melhores, mas na segunda melhorou.
A que se deveu essa melhoria?
Tivemos uma primeira semana difícil, com muitas pistas rápidas, muita lama, muita chuva, muito frio e, confesso, que tivemos alguns problemas mecânicos que nos condicionaram o resultado. Problemas normais de corrida, mas que nos impossibilitaram de fazer bons resultados. A segunda semana era mais à base de areia, só dunas. Em conjunto com a equipa, os problemas foram resolvidos e conseguimos ter uma semana bastante mais positiva.
O Dakar é, de facto, a prova mais exigente?
Sem dúvida alguma. Já tenho alguma experiência de todo-o-terreno e foi sem dúvida a prova de todo-o-terreno mais difícil que fiz até hoje. Só a amplitude térmica… Na primeira semana tínhamos temperaturas de zero e três graus. Na segunda já tínhamos 25 graus.
Preparou-se de uma forma especial?
A preparação física, mantive o que tínhamos feito no ano de 2022. Estava e estou bem preparado fisicamente, tento estar preparado fisicamente para todas as adversidades que enfrento. Para o Dakar foi manter o ritmo. Não foi ter um final de época para descansar, foi forçar ainda mais. A nível mental não dá para preparar. É tentar manter sempre a descontração. Tinha um navegador com muitíssima experiência e que me ajudou muito nesse aspecto.
Neste desporto não há um treino semanal. Como é que se preparam?
É verdade, não conseguimos estar com o carro todos os dias, mas passa muito por treinos físicos diários. Quando não temos corridas adequamos o ginásio aos movimentos que vamos apanhar no carro. Fazemos muito trabalho de pescoço, que é bastante importante. Fazemos um pequeno treino antes de cada prova, para ver se está tudo bem e para voltarmos a ganhar o ritmo de corrida. Quando não estão a ser usados, os carros estão a ser reparados ou revisionados para estarem na melhor forma quando chegam à corrida.
Competiu em T3 no Dakar, quando é que avançará para uma categoria principal?
Por mim, era já. O T3 é uma categoria que tem vindo a crescer muito ao longo dos anos e foi das categorias com mais competitividade no Dakar. Em 14 ou 15 etapas houve sete ou oito vencedores diferentes. Nas outras categorias, no T1, que é a categoria principal, deve ter havido quatro ou cinco vencedores. O T3 é um carro mais fácil para aprender a andar no deserto e nas dunas, mas, sem dúvida, o objectivo é num futuro Dakar ter oportunidade de participar na categoria principal, com os pilotos de topo.
Esse futuro Dakar é a próxima edição?
Espero que seja já o próximo. Não escondo a minha vontade de estar no próximo Dakar e ao volante de um carro de topo, mas não é fácil. Há que reunir todas as condições, estarmos preparados e pensar dia-a-dia. Temos um ano longo pela frente para nos prepararmos e quem sabe, poderá ou não surgir essa oportunidade.
Tem uma relação de proximidade com o Ricardo Porém. Sente que é o aluno que quer superar o mestre?
Além de ele me ajudar muito e ser um grande piloto, é um grande amigo. Considero-o primeiro um grande amigo antes de o considerar um grande piloto. Faço questão que ele esteja presente nas corridas e em todos os treinos para me ajudar. Mas, quando estou dentro da corrida, quer seja contra o Ricardo, contra o meu pai ou contra com que quer que seja, quero ser o melhor e quero ser o mais rápido. Se nessa situação conseguir ficar à frente do Ricardo, vou ficar. Agora consegui, em algumas etapas, do Dakar. Quando estou lá dentro não estou a pensar que tenho que ficar à frente do Ricardo. Tenho de dar o meu melhor e ganhar a geral. Não é ser melhor que o Ricardo ou do que o meu pai. Quero ser o melhor de todos.
Foi campeão nacional, campeão europeu e ibérico de todo-o-terreno. Até onde se vê chegar?
A época 2022 foi uma época de sonho e o campeonato foi um bocadinho surpresa. Nem era o nosso objectivo principal fazer o campeonato, era sim o europeu. Com o desenrolar das corridas achámos que seria melhor ajustar para tentarmos vencer as duas competições e conseguimos. Muito dificilmente volto a ter uma época como esta. No primeiro ano de estreia, com um carro novo, e vencer todas as competições é algo incrível. A RC fez um trabalho excelente, assim como o meu navegador, David. O futuro não sei. Gosto de pensar dia-a-dia, sempre com um olho posto no futuro. Se fizer as coisas bem hoje tenho a certeza que o futuro sorrir-nos-á.