Por esquecimento do que seja a sua ausência, por ignorância do que realmente significa, ou por défice de educação não formal, muitos, demasiados, confundem liberdade com o direito de fazerem o que querem; que ela formalmente comporta, mas que de modo algum a define, e sobretudo a reduz a um comportamento egocêntrico e inconsequente.
Na verdade, para se fazer o que se quer não é necessária a liberdade, atendendo a que esta atitude deverá estar associada apenas a actos para consumo próprio, sem importância para a comunidade e afastadas que estejam quaisquer possibilidades de consequências para terceiros.
Ande-se descalço na rua, comam-se farturas do Penim até rebentar, falte-se ao almoço da empresa, passe-se todo o domingo no sofá, emitam-se opiniões sobre a política externa da Patagónia, ou outra coisa qualquer que apenas ao próprio diga respeito, e tudo estará certíssimo. Mas não confundam isso com liberdade.
No capítulo do fazer-se o que se quer, parece haver também o “direito” a dizer publicamente mal dos que exercem uma função ou têm uma atitude pública, sempre que ela desagrada (e quantas vezes ela só desagrada por ouvir dizer, e o que se ouve dizer está longe da verdade); e diz-se mal do acto, mas sobretudo do actor, enchendo as conversas e as redes sociais de insultos e suposições ignorantes. Isso também nunca será liberdade, é só maldade, má educação, e um medieval julgamento em praça pública.
Porque liberdade a sério é uma responsabilidade enorme que nos foi entregue há 45 anos e que devíamos saber honrar, e saber ensinar a honrar.
Uma responsabilidade para onnosco próprios, para com os outros com quem avançamos nesta vidinha que queremos, e temos o direito de ter, cada vez melhor, e [LER_MAIS] para os que cá deixaremos a apanhar, ou não, o nosso lixo.
Mas a liberdade dá trabalho e é grande a tentação de o empurrar para outros, ou de inventar justificações imaturas, ou mesmo idiotas, para não o fazer.
É preciso procurar a informação correcta onde quer que ela se encontre, e não considerar as parangonas dos meios de comunicação social ou o diz que disse das redes sociais; é preciso não tomar as dores dos outros, e procurar fazer um juízo isento e informado sobre aquilo que queremos opinar; é preciso resistir ao comodismo e ao clubismo da bandeirinha e conseguir perceber que se os problemas mudam as soluções também têm que mudar; é preciso ser justo e valorizar tudo o que os “outros” fazem certo, e rejeitar tudo o que os “nossos” fazem de errado; é preciso não dizer que “eles” fazem e acontecem, como se “eles” não fossemos nós também, muitas vezes.
De nada serve ser-se solidário em conversas de sofá, ou soltar frases inflamadas qual treinadores de bancada; é necessário ser-se, e fazer-se, alguma coisa, para que alguma coisa mude.
Considerando que a liberdade se pode definir como a compreensão das alternativas que permitirá fazer a escolha, que tal “sermos” e portanto pensarmos, decidirmos, e votarmos a nossa vida, em vez de produzirmos os profundamente lamentáveis e vergonhosos 70% de abstenção nas recentes eleições?
*Professora de dança