“Para além de um excelente pintor, insere-se um fenómeno sociológico: todos conhecem Malhoa, não só na época, como actualmente”, diz Maria de Aires Silveira, responsável pela curadoria da exposição José Malhoa e Figueiró dos Vinhos, patente no Museu e Centro de Artes do concelho no norte do distrito de Leiria. “Em Figueiró, as pessoas lembram histórias, e também os modelos que serviram para as suas pinturas. De um modo geral, é o pintor mais popular”, comenta a historiadora e investigadora. E, agora, há “uma nova oportunidade” para revisitar o artista, o Grupo do Leão e o naturalismo português, também em Caldas da Rainha, com a reabertura do Museu José Malhoa, lembra a directora Nicole Costa, que destaca o retorno de obras como o “Álbum das Glórias”, de Rafael Bordallo Pinheiro.
Após mais de oito meses encerrado, o Museu José Malhoa está outra vez de portas abertas com a ajuda de um investimento superior a 467 mil euros, financiado, maioritariamente, por verbas do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR). O ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, presente na reabertura a 19 de Dezembro, já conhece as novidades. “Na nossa exposição de longa duração foram realizadas inclusões de novas obras, além de intervenções na disposição espacial dos acervos, para melhorar a experiência de fruição dos visitantes”, explica Nicole Costa. Por outro lado, “como marco deste novo momento”, que vai além da reabilitação do edifício, surge a exposição Experimental: Entre o Real e o Imaginário nas Reservas do Museu José Malhoa, que, segundo a responsável, “conta com diferentes gerações portuguesas, ligadas a experiências artísticas as mais diversas, entre a modernidade e a contemporaneidade”. Também para descobrir, a visita virtual e a digitalização de 1.546 peças, em 2D e 3D, que passam a estar disponíveis para o público.
É no Museu José Malhoa em Caldas da Rainha que se encontra o maior conjunto reunido de trabalhos do seu patrono, nascido em Caldas da Rainha, além de pinturas e esculturas de outros autores, que permitem percorrer mais de três séculos de arte. “Ressalta sua vocação como espaço de excelência para as actividades de investigação e divulgação sobre o naturalismo português”, assinala Nicole Costa, “mas, também demarca o papel da instituição enquanto fomentadora de novas visões sobre este artista e aqueles que o acompanharam e seguiram, como o núcleo ligado ao chamado Grupo do Leão, e sua discípula Maria de Lourdes de Mello e Castro – dentre outros”.
De Caldas a Figueiró dos Vinhos
Entretanto, no Museu e Centro de Arte de Figueiró dos Vinhos, continua patente a exposição José Malhoa e Figueiró dos Vinhos, inaugurada em Outubro para assinalar os 90 anos da morte do pintor. Apresenta “pinturas de José Malhoa pouco conhecidas” e “uma das suas primeiras pinturas, as cheias da ribeira de Santarém”, que “regista as tonalidades sombrias da tempestade, seguindo a linha de “arte moderna” proposta por Silva Porto e o Grupo do Leão”, adianta Maria de Aires Silveira, para quem se destaca, ainda, “a pintura mais significativa e popular de Silva Porto, “A volta do mercado”, importante obra para a aceitação do naturalismo, a paisagem e costumes portugueses e o registo da luz, num determinado momento”.
A partir de 1883, depois do convite do escultor Simões de Almeida, tio, José Malhoa encantou-se por Figueiró dos Vinhos, onde viveu, trabalhou e acabou por morrer, em 1933. “Demorou-se por Figueiró no entusiasmo da arte, empenhado no seu trabalho e não aguentou o Inverno rigoroso”, comenta Maria de Aires Silveira. A exposição inclui “pequenas paisagens, enquadramentos espontâneos, de aspectos da região, nunca apresentados, de momentos registados nos seus vários passeios nesta zona”.
A especialista do Museu Nacional de Arte Contemporânea sinaliza “a versatilidade do pintor, não só no aspecto técnico, no registo de paisagens luminosas” e “paisagens ensombreadas, habitualmente com figuras que relatam narrativas, histórias de quotidianos banais, mas também dramas e uma certa crítica social”. Por outro lado, acrescenta Maria de Aires Silveira, “é importante registar a diversidade temática”, porque “para além das paisagens”, Malhoa “também realiza o retrato expressivo, realista e sensível de observador atento” e “também é um pintor de alegorias, como “Apoteose da Lagosta”, grande tríptico que decorava o café Leão de Ouro, na rua 1.° de Dezembro, em Lisboa, onde se reunia o Grupo do Leão”.
“Tentámos apresentar estas diferentes formas de pintar e sentir de um artista versátil, excelente desenhador também, e integrá-lo na época, em finais do século XIX, relacionando-se igualmente com a literatura, como a importância da pintura “Clara”, inspirada no romance de Júlio Dinis, As Pupilas do Senhor Reitor. Clara aparece numa tela de grandes dimensões, como uma pintura épica. Acentua o realismo da dureza do trabalho e uma jovialidade e alegria na expressão do rosto”, conclui.
A exposição José Malhoa e Figueiró dos Vinhos pode ser visitada até 25 de Fevereiro de 2024.