Já alguém lhe disse que é “o Variações gótico” e também há quem o compare ao universo de Paulo Bragança e Sétima Legião. Chama-se Marciano, mas a música tem alma do planeta Terra e coração português. “Canções de âmago pop” e “reminiscências coldwave, post-punk e darkwave”, em que emerge, por vezes, “uma nuance fadística” e “alguma teatralidade”, de acordo com a Fade In, que o colocou no palco do Jardim Luís de Camões em 2024 durante o festival Extramuralhas. Apenas o terceiro nome de Leiria em treze edições.
Seis meses volvidos desde o concerto no Extramuralhas, Missão Amar-te, o segundo longa-duração de Marciano, é lançado esta sexta-feira (14 de Fevereiro, data em que se celebra o padroeiro dos namorados, São Valentim) e será apresentado ao vivo no Teatro Miguel Franco, em Leiria, depois das 22 horas, com entrada gratuita.
Num tempo em que o conceito de banda parece saído da pré-história, ou de um dicionário de ideias ameaçadas de extinção, o projecto a solo de Marciano está transformado em colectivo e a nave proveniente de Marte traz com ele o baterista Nuno Francisco e o baixista Rui Geada. A noite conta ainda com dois convidados: David Wolf e Carlos Amado.
“Dançar a dor”
Gravado e produzido ao longo de três anos, Missão Amar-te é um disco “à portuguesa”, diz Marciano, que aponta “a performance”, “o guarda-roupa” e a “mescla sonora” que vai “beber a muitos sítios” como alicerces da “identidade” que “cada vez mais” quer entregar ao público. “Amar é a missão, é esse o objectivo”. Por outras palavras, “dançar a dor”. O mundo do músico de Leiria revela-se no conjunto de dez canções produzidas por Paulo Mouta Pereira (numa fase inicial) e David Wolf, em que se inclui a versão do tema “Soldado”, dos Sitiados. Por falta de espaço, a edição em vinil tem menos uma faixa do que o CD e do que as plataformas digitais. Na abertura e no final, António Cova lê poemas de Jorge Vaz Dias; pelo meio, escuta-se Mc Santiago, a declamar outro poema, que escreveu.
No álbum, de que já são conhecidos os singles “Bissectriz” (2021, Novembro), “Missão Amar-te” (2023, Fevereiro) e “Sem Remédio” (2024, Dezembro), participam Ricardo Simões, Matt Howden, Daniel Reis, Cristiano Justino, Fernando Silva e Mário Dinis. A lista de colaborações fica completa com cinco artistas visuais – Paula João, Leonardo Pinto, Lisa Teles, Ateliê Obscuro e Sandrine Cordeiro – que assinam dez ilustrações inspiradas pelo ambiente e letras de Missão Amar-te. Surgem no livro de 24 páginas que acompanha o CD. Já o design gráfico é de João Diogo.
Melancolia e denúncia
Também voz do tributo Índios da Meia Praia, baseado no repertório de Zeca Afonso, Marciano editou 14.000 Dias Entre Terra e Marte, o primeiro LP, em 2017. Regressou, entretanto, a Leiria, mas mantém ligações fortes na região de Lisboa. É lá que está marcado o próximo concerto: 8 de Março, em Algés.
Como qualquer ser que gira à volta do Sol, o cantor e compositor de Leiria vai acumulando “maleitas” e instantes de “melancolia”, que espreitam nas entrelinhas de Missão Amar-te. Em dois temas do disco, no entanto, Marciano abandona a esfera íntima e reflecte sobre a guerra (as guerras) e a crise climática. Será esse, provavelmente, o fio condutor do que vai criar a seguir: resistência e denúncia contra fantasmas e nuvens de fel. “Há muito ódio no mundo neste momento”, argumenta. “Quero contribuir, porque o mundo está muito cinzento”.