Sabem aqueles momentos definidores que no Divertidamente, da Disney, são representados como umas bolas muito brilhantes? Aparentemente chamam-se memórias base.
Sempre achei essa representação muito bem sacada, porque cada vez que me lembro de alguns desses momentos, parece mesmo que algo se acendeu cá dentro. Hoje quero partilhar o momento em que a minha visão sobre os Direitos Humanos (DH) mudou.
Ainda me lembro de achar essa história dos DH uma treta meio anacrónica – achava que era um não assunto. O Direito Internacional tinha resolvido isso há muito tempo e, portanto, toda a gente era abrangida por esses direitos.
Para mim, o que era mesmo importante era acabar de vez com a fome e a pobreza, e nunca ligava uma coisa à outra – sim eu sei… em que mundo é que eu vivia, certo?
Quando decidi estudar em Inglaterra, aprofundar conhecimentos, levei um choque de realidade de tal ordem que ainda não me recompus. E é por isso que o momento em que percebi que isto tinha tudo a ver com DH foi um desses momentos definidores, um bola bem incandescente no quartel general das minhas memórias base.
Foi a ler um livro que mudou a minha vida, quando já tinha perdido toda a fé na Humanidade. Havia uma parte sobre a Amnistia Internacional e as denúncias que tinha feito a propósito dos milhares de mortos e desaparecidos do regime de Pinochet e, na verdade, um pouco em toda a América Latina, numa altura em que o mundo ainda achava (incrivelmente ainda acha…) que a Europa e os Estados Unidos da América são os legítimos polícias do mundo.
[LER_MAIS] Naquele momento, percebi que enquanto continuarmos sem querer saber do que se passa no mundo para além do nosso quintal, alguém irá decidir por nós, e que, mais vezes do que menos, decidem coisas com as quais jamais compactuaríamos.
Que a maior parte das violações de DH se passam enquanto achamos que está tudo sob o controlo dos nossos queridos líderes, lindos e democráticos.
Que quanto menos queremos saber, pior é o cenário de impunidade. Acredito que é por haver megafones humanos que não se calam e que levam a injustiça como uma afronta pessoal – e às vezes é mesmo uma questão pessoal – que ainda vamos conseguindo manter este mundo minimamente habitável.
Mas ainda há muitos lugares obscuros onde é preciso chegar, muitas denúncias que é preciso fazer. Foi naquele preciso momento, ao ler aquele pedaço de História, que decidi que queria ser um desses megafones humanos.
Só quando nos levantamos para lutar pelos nossos direitos – e quando digo nossos, quero dizer de todos e não só os meus – é que a injustiça começa a recuar.
*Activista