Um militar de 43 anos, que exercia funções no Destacamento de Trânsito da GNR de Leiria, prontificou-se a ajudar um amigo que teve um acidente rodoviário, identificando-se como condutor da viatura, mas as perícias ao veículo acabaram por desmontar a artimanha e os dois foram condenados a penas de prisão.
O caso remonta a Junho de 2015, foi objecto de uma condenação em primeira instância em Junho do ano passado, e a decisão foi agora revista pelo Tribunal da Relação de Coimbra, num acórdão datado de 11 de Janeiro de 2023, a que o JORNAL DE LEIRIA teve acesso, que manteve a condenação.
De acordo com a matéria provada em tribunal, o arguido que deu origem a todo este processo, também de 43 anos, seguia ao volante da sua viatura, quando se despistou, entre as 02:00 e as 02:50 horas, na Estrada Nacional 356-1, em Alcogulhe, concelho de Leiria. Na sequência do acidente, fracturou os ossos do nariz e o esterno, e sofreu escoriação malar, sangrando abundantemente, o que deixou marcas na porta do condutor.
O carro foi parar a um aqueduto e ficou de tal forma danificado, que o seguro determinou a sua perda total.
pesar dos ferimentos, o condutor, director de obra de profissão, ligou ao seu amigo GNR e pediu-lhe que fosse ao seu encontro, para, alegadamente, se identificar como condutor, evitando assim que fosse submetido ao teste de alcoolemia e ao exame para despistagem de substâncias psicotrópicas.
Ao mesmo tempo, fez uma chamada para a corporação de bombeiros da Maceira, onde era voluntário, avisando que se fossem alertados para o acidente, não accionassem os meios de socorro para aquele local.
Já na zona do acidente, o militar do Destacamento de Trânsito telefonou para a Sala de Situação da GNR, informou que havia tido um acidente e pediu que enviassem uma patrulha. Porém, quando os militares chegaram, recusaram tomar conta da ocorrência, por se situar numa área da competência da PSP. Inconformado, o GNR voltou a contactar a Sala de Situação e pediu para falar com o graduado de serviço, que acedeu a enviar outra patrulha.
Esta segunda equipa recolheu o depoimento do militar, que se apresentou como condutor e descreveu os contornos do despiste. Enquanto isto, o ‘verdadeiro’ condutor, seria transportado ao hospital por uma ambulância enviada pela corporação onde era voluntá- rio, sem ser submetido a qualquer teste de álcool ou drogas. Os dois assinaram depois uma declaração amigável para o seguro, onde o GNR se identificou como condutor.
Tudo parecia correr de feição, não fossem os vestígios de sangue encontrados na viatura, apenas do lado do condutor. Descoberta a mentira, o caso foi parar a tribunal. Em primeira instância, o Tribunal de Leiria condenou o militar da GNR como co-autor de um crime de burla qualificada, falsificação de documento, falsas declarações e abuso de poder, na pena única de 20 meses de prisão, suspensa por um período de dois anos, com sujei- ção de regime de prova.
O outro arguido, foi condenado pelo mesmo tipo de crimes, com excepção do de falsas declarações, a uma pena de 16 meses de prisão, também suspensa por dois anos.
Ambos recorreram para o Tribunal da Relação de Coimbra, que deu provimento parcial ao recurso, absolvendo-os dos crimes de falsificação de documento e abuso de poder em co-autoria, mas mantendo a condenação a penas de prisão de 12 meses para os dois, suspensas por um ano. O proprietário do veículo pode ainda ter que devolver os cerca de 14 mil euros recebidos do seguro.
Acusados de alterar escala para ir buscar indemnização
O Tribunal de Leiria está a julgar três militares da GNR, um dos quais aposentado e outro em licença, acusados da prática dos crimes de falsificação de documento, abuso de poder e burla qualificada. Na primeira sessão de julgamento, realizada no dia 19, os militares negaram ter combinado entre si alterar a escala no livro de relatório diário do posto de Caldas da Rainha. Um dos arguidos, que à data do factos exercia funções de comandante, em substituição, admitiu que houve mudanças na escala no fim-de-semana em causa, mas que estas se deveram à morte de familiares de dois militares e não para beneficiar um dos arguidos, como alega a acusação. Os factos remontam a Fevereiro de 2014 e envolvem um sargento-mor da GNR, reformado no ano seguinte, o seu filho, guarda principal, e o então comandante do posto. A acusação sustenta que os três “combinaram” alterar os registos da escala, de forma a que o acidente que o filho do sargento-mor sofreu fosse considerado em serviço, o que lhe permitiu receber quase 28 mil euros da Caixa Geral de Aposentações.