Conhecidas as listas dos alunos colocados nos diferentes estabelecimentos de ensino, volta a colocar-se a questão das moradas falsas entregues por alguns encarregados de educação nas escolas.
Ao deixar entrar estudantes cujas moradas não correspondem à verdade, há estabelecimentos que estarão a deixar de fora alunos que realmente residem à porta da escola. Embora o assunto tenha assumido agora maior visibilidade, o JORNAL DE LEIRIA tem vindo há muito a reportar este problema, que se coloca tanto nos estabelecimentos de ensino particular como nos de ensino público.
Alguns pais alteram moradas para colocar os filhos em escolas mais centrais e com melhor reputação. Outros lamentam que a diferenciação comece na escola, quando aí mesmo deveriam ter início os princípios da inclusão.
Duas mães de Leiria, que preferem manter o anonimato, admitem ter mentido para assegurar a entrada das filhas em escolas que não pertenciam à sua área de residência. “A minha filha pertencia à Escola Secundária Afonso Lopes Vieira, dos Marrazes, mas preferia uma das escolas do centro de Leiria. Então dei a morada de uma amiga, que mora na cidade e essa amiga foi a encarregada de educação durante todo o ano”, admite a mãe.
Diz ter agido dessa forma por várias razões: “não existe autocarro directo entre o local onde reside e a Afonso Lopes Vieira, mas existe para aquela escola; e porque no centro há acesso facilitado à biblioteca municipal”.
[LER_MAIS] Como conseguiu? Com facilidade. A amiga da mãe só precisou de entregar um comprovativo de morada na escola. Quanto à mãe, só teve de justificar por que razão a encarregada de educação não era um dos pais.
Outra mãe explica como garantiu a entrada na filha numa secundária da cidade, quando esta tinha concluído o 9.º ano em Fátima. “Para não correr o risco de entrar nos Marrazes, e como os meus sogros moram no centro de Leiria, mudaram os contadores para o nome do meu marido.”
“Esta era a escola que ela queria, para onde iam os amigos, e a que tinha o ambiente social mais indicado até de acordo com os testes psicotécnicos que tinha feito”, argumenta a mãe, que reconhece que se trata de uma escola que “está na berra”, por “uma questão de moda e de status. Há, por outro lado, quem só tenha razões para lamentar a falsificação de moradas.
Uma mãe que reside nos Capuchos lamenta que o filho não tenha conseguido entrar nem na EB1 dos Capuchos, quando “tem a escola à porta”, nem na EB1 Amarela nem na EB1 Branca. É certo que só tem 5 anos e que os mais velhos terão prioridade, admite a mãe. “Mas teria vaga se não existisse um problema nos critérios de admissão que começa logo no pré-escolar”, acredita a encarregada de educação.
Esta mãe sabe de “pais que vão à repartição dizer que perderam cartões de cidadão para fazer novos, com morada falsa; mães que alugam apartamento numa área onde não residem para apresentar comprovativos de morada na escola; pais que preferem atrasar o percurso escolar dos filhos e mantê-los mais tempo no pré-escolar até garantirem vaga em determinada escola”.
Numa sociedade “que se quer diversificada e cosmopolita”, “a inclusão é só nos livros?”, “a escola promove a diferenciação?”, “as escolas não são todas iguais?”, questiona a mãe, que pede fiscalização. Até ao fecho de edição não foi possível ouvir o Ministério da Educação.
Difícil fiscalização
O director da Escola Secundária Afonso Lopes Vieira, Pedro Biscaia, considera que em Leiria não há elitização de secundárias, porque nos três estabelecimentos não se repetem cursos. O problema talvez se coloque em ciclos de ensino anteriores, motivado pela questão do transporte dos alunos, admite o professor.
Da direcção do Agrupamento de Escolas D. Dinis, Rodrigo Pereira rejeita que haja escolas de elite, mas antes “escolas centrais, de qualidade”, que tornam o agrupamento “muito solicitado”.
Quanto a moradas falsas,“acreditamos na boa fé e nos documentos que nos entregam”, explica o professor, notando que a norma é pedir facturas de contratos de água ou electricidade.
José Cunha, presidente da União das Freguesias de Leiria, Pousos, Barreira e Cortes, diz que, para efeitos escolares, a norma é emitir atestado de residência com base nos dados do cartão de cidadão. “As pessoas até poderão ir ao registo mudar as moradas só para poderem ter os alunos nalguma escola, mas isso já é entrar em incumprimento e isso não nos compete a nós fiscalizar”, salienta o autarca.