O dinheiro do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) está a levar uma parte da cultura portuguesa do mundo físico para o ambiente online e, em breve, não será preciso sair de casa para, por exemplo, observar todos os pormenores do portal principal da igreja do Mosteiro da Batalha, durante muito tempo um enigma para os historiadores de arte.
Há mais de 40 anos no radar da Unesco, que lhe atribui estatuto de património da humanidade, o Mosteiro da Batalha é um dos monumentos na iniciativa do Ministério da Cultura para digitalizar, com as mais avançadas tecnologias, e o apoio do PRR, milhares de bens culturais em diferentes regiões do país, incluindo no distrito de Leiria.
“É aliciante”, diz o director do Mosteiro da Batalha, Joaquim Ruivo, porque, no caso do pórtico do século XV construído sob orientação do mestre Huguet, permitirá avaliar, “com um detalhe impressionante”, que o visitante não consegue “à vista desarmada”, toda a iconografia de dezenas de estátuas esculpidas em pedra que representam profetas e reis do Antigo Testamento, apóstolos, diáconos, monges, bispos, papas, mártires, santos, anjos, a coroação da Virgem e o trono de Deus.
Provavelmente, desafia a experiência ao vivo. O coordenador do projecto, Luís Sebastian, citado pela agência Lusa, chama-lhe “milagre” e antecipa que “o day after [dia seguinte] vai ser revolucionário”, dada a escala e a minúcia inéditas do registo tridimensional.
Caldas, Alcobaça e Batalha
Os mosteiros da Batalha e de Alcobaça, o Museu Dr. Joaquim Manso na Nazaré, o Museu Nacional Resistência e Liberdade em Peniche e o Museu de José Malhoa e o Museu da Cerâmica em Caldas da Rainha integram o projecto Património Cultural 360, apresentado em Lisboa na sexta-feira, 16 de Janeiro, que abrange 65 museus, monumentos, palácios e sítios arqueológicos sob tutela do Ministério da Cultura.
A partir de 2026, de forma universal e gratuita, segundo o Governo, ficarão disponíveis online 13 filmes, 65 visitas virtuais e a digitalização 2D e 3D de 59.500 bens culturais móveis. De pequenas obras de ourivesaria a peças de vestuário, pinturas ou mesmo esculturas de várias toneladas.
Até ao momento, há 20 mil digitalizações. Progressivamente, os resultados vão surgir no endereço arquiva.patrimoniocultural.gov. pt e o projecto pode ser acompanhado através do site makingof360. patrimoniocultural.gov.pt, onde já se encontram imagens do Museu Nacional do Teatro e da Dança, do Museu Nacional do Traje, do Museu Nacional do Azulejo, do Museu Nacional dos Coches e do Palácio Nacional da Ajuda, além de vídeos relacionados com as visitas virtuais ao Mosteiro dos Jerónimos e ao Panteão Nacional, entre outros espaços.
Milhões de euros
Nos museus José Malhoa, da Cerâmica e Dr. Joaquim Manso “serão mais de 2.500 itens a serem digitalizados”, de acordo com a directora, Nicole Costa. “Possibilitará adensar a nossa presença digital e tornar os nossos acervos ainda mais conhecidos”.
No Mosteiro da Batalha, além do portal principal, o trabalho, que “vai começar em breve”, engloba peças da reserva, o portal do transepto da igreja, o túmulo de D. João I e D. Filipa de Lencastre e os frontais dos túmulos dos infantes D. Fernando, D. Henrique e D. João, ou seja, “contempla aquilo que se considerou essencial”, comenta Joaquim Ruivo, para quem a inclusão da Capela do Fundador é “muito importante” não só “para a visita virtual” como “para os investigadores”, a quem é dada a “possibilidade excepcional” de realizarem pesquisa à distância. E conclui: “Sobretudo, estamos a preservar o património, digitalizando-o”.
A visita virtual ao Mosteiro da Batalha já existe no Google Arts & Culture, e a Capela do Fundador também já tinha sido sujeita a um levantamento tridimensional por computador no contexto de um estudo da Universidade de Évora, esforços que, na opinião de Joaquim Ruivo, a iniciativa Património Cultural 360 “complementa”.
A nível nacional, o investimento ascende a 11,7 milhões de euros, coordenado pelas entidades Património Cultural e Museus e Monumentos de Portugal. Para concluir até 31 de Dezembro de 2025.