Este é um festival que o Pedro Oliveira e a Vitória Condeço, diretores da companhia, nos habituaram a esperar como um momento alto na vida cultural do nosso concelho e, pela extensão do programa a concelhos limítrofes, um excelente exemplo do potencial de formação, produção e programação cultural de elevada qualidade que Leiria quer assumir face ao país.
O cartaz deste ano destaca-se pela qualidade e diversidade das propostas estéticas dos espetáculos, bem como pela multidisciplinariedade das iniciativas que incluem o lançamento de livros, uma exposição, leitura encenada e música.
Não é por acaso que temos este festival e esta companhia. Um evento com esta qualidade e prestígio implica um entendimento e compromisso consistente entre uma ideia e a sua execução. O elevado nível de qualidade atingido na edição deste ano deve, pois, ser considerado como o resultado de uma maturação.
Um projeto cultural só merece esse nome quando – a exemplo do Nariz – se alicerça numa formação cuidada e que carece de anos para se fundamentar; quando a sua produção se faz num contínuo evolutivo e com uma definição precisa dos modelos epistemológicos que norteiam a atividade de uma companhia; quando programa no sentido de um apuramento da sensibilidade e gosto para os desafios que comporta a diversidade estética com que se formam públicos.
Naturalmente tal processo implica o apoio inequívoco e continuado das entidades que a montante deverão entender o, por vezes, longo intervalo de tempo necessário para a consolidação dos projetos.
[LER_MAIS] E não só de apoio financeiro se fala aqui mas sobretudo de garantir condições de trabalho que permitam receber formandos, outras companhias e espetadores num ambiente digno; do apoio à divulgação das atividades; da competência de saber escutar quem faz teatro e fazer o cruzamento multidisciplinar com outras atividades e iniciativas locais e regionais; do imprescindível apoio à edição e distribuição de materiais teóricos e textos dramáticos em que se alicerça a atividade de uma companhia de teatro.
Vivemos, hoje, um tempo assente no paradigma da sociedade do espetáculo e do entretenimento, uma era em que a arte amiúde se confunde com interesses mercantilistas e onde impera o gosto medíocre de quem detém o poder de publicitar com estrondo e ruído.
O ACASO, tal como, mais modestamente, o SINOPSE – Festival Ator João Moital (da responsabilidade do TE-ATO), são exemplos de uma contracorrente do facilitismo. Ambos fazem diferente e melhor, com fôlego para fazer mais.
Leiria propõe-se ser Capital Europeia da Cultura. Diria que Leiria já é uma Capital da Cultura pela diferenciada e elevada qualidade de alguns dos seus criadores locais nas diversas áreas das artes.
Cumpra, quem de direito, a função catalisadora de envolver todo o potencial ao seu dispor e ter a coragem política de não se deixar enredar pelos oportunistas de ocasião que, como sempre, se perfilam já à míngua de ganhos fáceis.
*Psicólogo Clínico e diretor artístico do TE-ATO
Texto escrito de acordo com a nova ortografia