Há um novo grupo de teatro em Leiria, que se dá a conhecer no feriado da revolução. Entre ensaios, na contagem decrescente, ele e elas não perdem o sentido de humor, nem mesmo para falar de assuntos seguramente polémicos, como quando o mundo, de repente, se divide entre quem tem e quem não tem felinos em casa.
Cátia Ribeiro e Paulo Kellerman já antes trabalharam juntos, e neste projecto, adicionaram Rita Rosa, mas o trio rapidamente virou quinteto, com a chegada de Andreia Mateus e Catarina Mamede.
A estreia da companhia Nem Marias Nem Manéis acontece amanhã, sexta-feira, 51 anos após o 25 de Abril, no restaurante e bar Atlas, em Leiria, com um espectáculo em formato performance – Cruza as Pernas Como uma Rainha – desenvolvido propositadamente para o cenário onde vai ser apresentado.
Duas sessões, às 18 e 18:30 horas, que em sintonia com a data e com o ar dos tempos especulam sobre a liberdade e a situação da mulher, mais de meio século após a madrugada que possibilitou a democracia.
Com Rita Rosa ausente por desencontro de agendas, são os outros elementos do colectivo que explicam ao JORNAL DE LEIRIA como a estrutura artística Nem Marias Nem Manéis se ergue na ideia de “que a arte precisa de agitar” (Paulo Kellerman), “criar desconforto” (Andreia Mateus), “dar voz” (Catarina Mamede) e “inspirar” (Cátia Ribeiro).
É o que procuram na primeira vez perante público: segundo a nota de divulgação, Cruza as Pernas Como uma Rainha – título que enfatiza o que boa parte da população, por estes dias, ainda espera, assinala Catarina Mamede – “mergulha no universo feminino para celebrar as revoluções – interiores, sociais e históricas – e a liberdade” e a partir de “um texto provocador” imaginado por um homem, o escritor Paulo Kellerman, “propõe uma reflexão urgente e sensível sobre o lugar da mulher na sociedade, a autonomia dos corpos e das vontades e o poder da voz feminina”.
A conversa – em que também se falou de gatos, pessoas de gatos e imagens de gatos nas redes sociais – serve de prova: eles nem sempre são assim tão sérios. Mas o mundo está realmente estranho. “Fez-nos todo o sentido celebrar o 25 de Abril no feminino. E, aliás, por tudo o que tem vindo a acontecer, cada vez faz mais sentido”, diz Catarina Mamede. “Há mais casos de opressão, de violência, e achamos necessário que se fale sobre isso”, realça Cátia Ribeiro, responsável pela direcção de actores e dramaturgia de Cruza as Pernas Como uma Rainha, em que se mistura “o passado, o presente e o futuro de uma mulher” – que pode ser qualquer mulher – entre os derradeiros anos de ditadura e o horizonte colocado em 2040.
“Vai haver três momentos em três salas diferentes, cada um protagonizado por cada uma das actrizes”, adianta Paulo Kellerman. “E esse conceito tem ligação também com o próprio texto, ou seja, há um casamento feliz”, conclui Andreia Mateus, que partilha a interpretação com Catarina Mamede e Rita Rosa.
Actividades até Setembro
Teatro, produções para espaços não convencionais, formação: o programa Nem Marias Nem Manéis. Próximo acto, já no mês que vem, uma nova peça, que será apresentada pela primeira vez na Maia (com reposição em Julho) em relação com um projecto que envolve migrantes a viver em Portugal. Lá para Junho, está prevista outra performance, enquadrada no aniversário do núcleo de Leiria da Rede Europeia Anti-Pobreza (EAPN). E, em Setembro, por fim, a estreia em sala. Em qualquer caso, o mesmo objectivo: espectáculos “que de alguma forma impactem as pessoas”.