No terceiro trimestre do ano passado recorreram ao Processo Especial de Revitalização (PER) 120 empresas, número que traduz uma queda de 72% face às 433 que o fizeram em igual período de 2016, de acordo com os últimos dados divulgados pela Direcção-Geral da Política da Justiça.
O que explica estas descidas? O facto de a economia atravessar um período de retoma terá o seu peso, mas o principal motivo serão as novas regras aplicadas ao PER, que entraram em vigor em meados do ano passado.
Vieram tornar o mecanismo mais exigente, garantindo que as empresas que a ele recorrem têm efectivamente possibilidades de sobreviver e que o PER não é apenas uma ante-câmara para a insolvência. Ou seja, tornou-se mais difícil recorrer a este mecanismo, confirmam os administradores de insolvência ouvidos pelo JORNAL DE LEIRIA.
O Processo Especial de Revitalização “destina-se a permitir à empresa que, comprovadamente, se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja susceptível de recuperação, estabelecer negociações com os respectivos credores de modo a concluir com estes acordo conducente à sua revitalização”.
Agora, para que uma empresa possa recorrer ao PER para evitar um processo de insolvência é preciso que apresente uma declaração com menos de 30 dias, passada por contabilista certificado ou por revisor oficial de contas, atestando que não se encontra em situação de insolvência actual, à luz dos critérios previstos no artigo 3.º.
A isto soma-se o facto de ser obrigatório que pelo menos 10% dos credores (de créditos não subordinados) manifestem intenção de encetar negociações e de aprovar o plano de recuperação, que tem de ser apresentado na fase inicial.
“O facto de o PER se ter tornado mais exigente não facilita o acesso por parte das empresas”, diz Carlos Inácio. O administrador judicial de Alcobaça refere que as sociedades que a ele queiram recorrer têm agora de “estar em melhores condições” do que antigamente, quando muitas das que pediam um PER estavam já em grandes dificuldades.
Jorge Calvete, da Marinha Grande, afirma não ter sentido na sua actividade uma diminuição do número de processos de revitalização, porque já antes das novas regras “só aceitava casos em que a empresa apresentasse condições de ser recuperada”. Mas confirma que, no geral, houve uma quebra no número de entradas de processos em tribunal.
Para este administrador de insolvência, as mudanças não são necessariamente más. “O que acontecia é que antigamente muitas das empresas que recorriam ao PER estavam insolventes e com o processo ganhavam tempo para procurar uma solução”.
Com as novas regras, “os credores percebem que a empresa que recorre a este mecanismo tem hipótese de ser recuperada”. É que, entende, as alterações, que “podiam até ser mais rigorosas, vieram moralizar”.
Também o presidente da Associação Portuguesa dos Administradores Judiciais (APAJ) sublinha que o PER é agora “de muito mais difícil acesso” e que “há menos empresas a recorrer” a este meio de tentar resolver os seus problemas.
Citado pelo Jornal de Negócios, Inácio Peres explica que este mecanismo se tornou “muito mais exigente”, mas também ele vê nisso algo positivo. É que, tal como tinha sido desenhado, em 2012, o PER acabava muitas vezes por ser uma espécie de ante-câmara para a insolvência de empresas que tinham à partida uma morte anunciada.
[LER_MAIS] “Da minha experiência, diria que o PER foi instituído para reactivar a economia, mas esta não se reactiva por decreto”, comenta Leonel Santos. Este administrador de insolvência de Peniche considera que este mecanismo estava sobretudo a servir para “adiar o inevitável”. “Creio que a maioria dos processo resultava em insolvência”, diz, adiantando que o “PER exige negociação com os credores, sendo que estes se apercebem que o devedor o tem aproveitado para ganhar tempo”.
Dos vários mecanismos que compunham o pacote preparado pela Estrutura de Missão para a Capitalização de empresas, e no qual se incluem as mudanças no PER, falta ainda pôr no terreno o Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas (RERE), que permitirá, nomeadamente, fazer acordos confidenciais apenas com alguns credores e recorrer a mediadores, uma nova figura também a ser criada. Aprovado no Parlamento no final de Dezembro, falta ainda a sua promulgação e publicação em Diário da República.
“Acho que não terá grande adesão, porque não vincula todos os credores, apenas os que entrarem no acordo. Os restantes poderão sempre recorrer às vias judiciais à sua disposição”, comenta Carlos Inácio.