Se Portugal fosse a “jangada de pedra” do Saramago, já há muito que teria naufragado de borco, porque o País é dramaticamente desequilibrado. As áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto (35 municípios) concentram 44% da população residente no País e representam apenas 6% do território.
Ou seja, significa dizer que o restante do País (menos de 6 milhões de habitantes em 94% da sua área geográfica) tem uma densidade demográfica de 66 habitantes por km2 (a média nacional é de 114 hab./km2).
Portugal está na UE desde 1986, e há quase três décadas que tem beneficiado dos fundos comunitários iniciados com o I QCA (1989-93). Segundo Augusto Mateus (25 Anos de Portugal Europeu, 2013), no período 1989-2011, no âmbito dos fundos estruturais e de coesão, Portugal executou o montante de 81 mil milhões de euros.
No âmbito do FEDER, o financiamento europeu foi de 43 mil milhões de euros. E, nesse mesmo período, o País construiu, ampliou e reabilitou 6.332km de estradas contra 2.353km de vias férreas.
Portugal entendeu que as rodovias iriam diminuir as assimetrias regionais, mas a verdade é que as autoestradas acentuaram ainda mais os desequilíbrios entre as regiões.
Em larga medida, o País falhou o seu desenvolvimento regional e, a partir de agora, tudo pode ser demasiado tarde. Em 2015, e enquadrado no programa PT2020, o governo identificou 164 municípios considerados de baixa densidade (baixos níveis de rendimento, empreendedorismo e inovação, fraca densidade populacional, valores acentuados de emigração e de [LER_MAIS] envelhecimento, poucos serviços, escassa oferta de emprego).
No entanto, para o próximo quadro comunitário de apoio 2021-2027, segundo o Expresso (24/3/18), Portugal pode receber menos 15% de fundos comunitários (4 mil milhões de euros) face ao actual quadro 2014-2020.
Como é sabido, à escala nacional e também mundial, os territórios competem cada vez mais pela captação de recursos produtivos (capital e trabalho). No interior da UE, e num contexto de redução de verbas, os territórios também competem pela captação de fundos comunitários.
Por exemplo, a Andaluzia, que tem 8,5 milhões de habitantes (mais do que os 164 municípios portugueses de baixa densidade), no próximo quadro comunitário 2021-2027 vai competir com Portugal no acesso aos fundos europeus, sobretudo o FEDER.
Portugal é um País demograficamente envelhecido e desequilibrado. O futuro dos municípios portugueses, e das regiões deprimidas, será a capacidade de, cada um deles, criar uma força atractiva e cumulativa de crescimento endógeno.
Apesar de haver casos crescentes de Investimento Directo Estrangeiro (IDE) em concelhos do interior, nos últimos 23 anos, o IDE captado pelo País foi basicamente para Lisboa e Porto. O maior desafio para o futuro deste País é a ocupação coesa do território.
Nada se localiza ao acaso. Portugal deve, o quanto antes, pôr em prática um modelo misto de descentralização (transferência de algumas competências do poder central para o poder local) com desconcentração (transferência de alguns serviços centrais do Estado em Lisboa para outras regiões do País).
Esse modelo misto descentralização/desconcentração servirá de base para a promoção e fortalecimento de clusters regionais e, consequentemente, de força atractiva e cumulativa de desenvolvimento regional endógeno num contexto de redução de fundos comunitários.
*Docente do IPLeiria