Com a liberalização permitida pela legislação de 2015, o bar Os Filipes, há mais de 30 anos no Terreiro, passou a encerrar mais tarde, por vezes em horários que fazem concorrência às discotecas. O anfitrião que tantas gerações conhecem está frontalmente contra a proposta da Câmara Municipal, criada para disciplinar o funcionamento dos estabelecimentos de bebidas em quatro zonas urbanas – porta aberta até à uma nos dias úteis e até às duas da manhã nos fins-desemana. Manuel Pereira Oliveira, que se considera "um pioneiro" na noite de Leiria, avisa que "voltar atrás é dar cabo não só das casas como da cidade" e garante que o regulamento, já aprovado em reunião de vereadores, e que segue agora para consulta pública, "é péssimo para o negócio" dos bares. Pode mesmo levar muitos empresários "a fechar" a actividade. "Não concordo de maneira nenhuma". Quanto ao ruído, prevê "muito mais confusão", porque "as pessoas saem todas à mesma hora, vai tudo para a rua fazer barulho". O que falta "é segurança na rua".
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Outra voz, a mesma opinião. "Sou completamente contra", afirma o gerente do Porta Santa, que se diz "sujeito a fechar a casa". António Vibaldo afirma que Leiria "tem de se equiparar às outras cidades do País" e constata que "a vida académica é isto". Os clientes vão primeiro aos cafés e só começam a chegar aos bares depois das 23 horas. "Nós não vivemos na Alemanha ou na Noruega". Um horário "viável" e "lógico" seria até às duas da manhã nos dias úteis e até às quatro da manhã nos fins-de-semana, sugere. Por outro lado, acredita, "se o centro histórico fosse policiado, não havia tanto problema".
Mário Brilhante é peremptório: o que a Câmara Municipal de Leiria propõe "não é exequível", pois, "pura e simplesmente inviabiliza o negócio dos bares". O proprietário do Anubis acredita que a liberalização, depois de 2015, teve um efeito positivo, porque "deixou de haver grandes aglomerações nas saídas". Pede, portanto, mais reflexão sobre uma actividade que contribui para a socialização em tempo de relações digitais e que depende dos horários a que os clientes saem do trabalho, cada vez mais tardios. "Uma boa parte disto tem a ver com civismo" e "casos pontuais têm de ser tratados" como tal, acrescenta. É também da opinião que "a polícia pode dar um contributo grande" para impedir excessos. "Pode fazer valer uma lei que sempre existiu que é o direito ao descanso e dizer às pessoas que não podem estar a fazer barulho" nas ruas.
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No caso do Praça Caffè, que se estende até às três da manhã, ou, raramente, até mais tarde, os horários propostos pelo Município têm menos impacto. "Trabalho desde as oito da manhã. São alguns euros que não vão entrar e todo o dinheiro faz falta, mas não é crítico". Ainda assim, Carlos Dinis, que mora no centro histórico, sugere uma revisão da proposta do Município, para permitir um alargamento do horário no Verão, a pensar nos turistas, nas férias e no bom tempo. E afirma que a responsabilidade "não é dos bares", porque "os estabelecimentos têm algum cuidado" e procuram não infringir as regras. "Se o problema é o ruído na rua, a partir de determinada hora, é um problema de ordem pública" e de "educação". Ou seja, "há pessoas a fazer barulho", mas "não estão nos bares". Logo, "seria necessário mais policiamento". Actualmente, aponta, "mais facilmente se encontram polícias a passarem multas do que no sábado à noite a patrulhar".
A perspectiva de Luís Marques é a de quem mora na Praça Rodrigues Lobo e gere o hostel e bar Atlas na Rua Direita. Não tem a certeza se o regulamento que a autarquia quer aplicar "é suficiente" para conciliar os vários interesses em jogo, ou seja, dos empresários, dos clientes e dos que estão em casa a descansar, até porque "falta polícia nas ruas". Mas conclui: "Para o centro histórico ser atractivo tanto para negócios como para moradores as pessoas têm de conseguir dormir".