O preconceito, a liberdade, o desinteresse em ouvir o outro, o direito à felicidade e a importância do sonho e da arte manifestam-se na estreia do escritor de Leiria Paulo Kellerman como libretista, com os reclusos do Estabelecimento Prisional de Leiria – Jovens, no contexto do projecto Ópera na Prisão – Traction, desenvolvido pela SAMP – Sociedade Artística Musical dos Pousos em parceria com o Gran Teatre del Liceu de Barcelona e com a Irish National Opera, da Irlanda.
Os reclusos do EPL – Jovens regressam a Lisboa e ao palco da Fundação Calouste Gulbenkian nos dias 2 e 3 de Junho, quarta e quinta-feira, para revelar a cena de ópera Nós. Vocês. Toda a gente – é o primeiro momento de partilha com o público no processo de co-criação comunitária da grande ópera a apresentar no próximo ano, concebida e ensaiada no Pavilhão Mozart, um centro de artes performativas no interior da prisão, em Leiria.
Com a ajuda de tecnologias digitais, os espectáculos de 2 e 3 de Junho vão acontecer a partir de diferentes espaços: alguns reclusos estarão no auditório 2 da Gulbenkian com músicos, o maestro principal, três solistas líricos, familiares e funcionários do EPL – Jovens que integram o coro, outros reclusos participam desde o Pavilhão Mozart, acompanhados por pianista e maestrina, e, explica Paulo Lameiro, coordenador, com David Ramy, do projecto Ópera na Prisão – Traction, são esperadas, também, intervenções do exterior.
Embora “muito condicionado” pela pandemia, Paulo Kellerman acredita que o esforço de co-criação “torna o trabalho mais rico” e diz valorizar “a experiência” tanto como o resultado. “O que foi sendo feito tem que ver com o que eu ouvi e senti quando estive lá”, explica. “A ideia é que eles se identifiquem”.
A história em Nós. Vocês. Toda a gente, segundo o escritor, relaciona-se com “o julgamento público”, a “percepção dos outros”, o “preconceito focado na população prisional”, mas não só, “é extensível [ao resto da] sociedade”. E mostra como tudo “se pode atenuar quando conhecemos os outros e as suas realidades”.
Ainda em Junho, dia 19, está agendada a apresentação na Tanoaria do EPL – Jovens, em Leiria.
No projecto internacional Ópera na Prisão – Traction, que alia ópera e tecnologia digital, com realidade virtual aumentada, para promover práticas comunitárias de co-criação e a inclusão através da arte, colaboram os compositores Francisco Fontes, Nuno da Rocha e Pedro Lima e os solistas Carla Simões (soprano), Cátia Moreso (mezzosoprano) e André Henriques (baixo/barítono).