Andava todas as semanas pelas lojas da cidade à procura de novos rebuçados para a visita dominical ao pai. Com pouco açúcar a pensar na diabetes que o acompanhava há muitos anos, mas com a dimensão certa para que durassem o tempo de leitura das dez páginas que ainda conseguia ler por dia.
De ervas suíças para o Inverno e para os pequenos resfriados que lhe afectavam por vezes a garganta. De limão e sabugueiro para os dias mais quentes em que a boca lhe secava durante os passeios – sempre os mesmos – pelo jardim.
Ao domingo esperava-a religiosamente no hall de entrada. Sorria mal a via assomar-se à porta e depois de uma breve saudação verificava de imediato se trazia o saco de papel com os rebuçados para a semana.
Trocava de seguida longas impressões sobre a textura de uns, o sabor de outros e sobretudo sobre a dimensão. A dimensão certa que lhe permitia ler as dez páginas do livro e chegar ao fim da sua leitura ainda com o leve gosto do rebuçado na boca. «Ah, os do Dr. Bayard! Os perfeitos são os do Dr. Bayard! Duram o tempo certo», sublinhava todos os domingos.
Só depois da inspecção minuciosa da diversidade de rebuçados que ela lhe trazia para semana, já com um na boca, é que lhe dirigia finalmente o olhar. Perguntava-lhe pelo filho, pela vida, pela saúde, pelo trabalho e depois de lhe observar escrupulosamente o rosto, já com um rebuçado na boca, dizia-lhe – «Continuas bonita, mas com ar cansado e com mais umas rugas. Que pena…». Falavam depois sobre as dez páginas do livro que tinha lido naquele dia (da leitura do dia anterior já não se lembrava muito bem… também os rebuçados já tinham acabado há dois dias, queixava-se quase em silêncio).
Isso servia de pretexto para que lhe contasse mais uma vez as peripécias dela na infância e de como lhe roubava os rebuçados Dr. Bayard que já na altura [LER_MAIS] trazia no bolso do casaco. Despedia-se depois dela com um abraço mais caloroso do que aquele com que a tinha recebido à chegada, agora com o saco de papel com os rebuçados pela mão. E recomendava-lhe que não se esquecesse da nova remessa no domingo seguinte. «Não te canses a procurar mais. Traz sempre os do Dr. Bayard.».
No caminho de regresso a casa, ao final do dia, confirmava o ar cansado e a profundidade das rugas pelo canto do espelho retrovisor. Estavam lá efectivamente, rebuçados à parte. À noite, na agenda de afazeres para a semana, registava de novo a nota «procurar novos rebuçados para o pai.».
À chegada à porta do hall, no domingo seguinte, ele dizia-lhe, depois de inspeccionar o saco de papel e já com um rebuçado na boca: «Continuas bonita, mas com ar cansado e com mais umas rugas. Não te canses mais a procurar novos rebuçados, traz os do Dr. Bayard. Um pacote chega. Esta semana li só oito páginas por dia.»
*Assessora de imprensa