De um lado da mesa, sentam-se os idosos. Do outro, crianças. Não se conhecem, mas interagem quase como se fossem avós e netos, partilhando conversas e gargalhadas, enquanto os mais pequenos vão pintado desenhos que, no final, entregarão aos mais velhos.
É mais uma actividade do Abraço de Ouro, um projecto iniciado há cerca de três meses pelo Centro Paroquial de Assistência do Juncal (CPAJ), em Porto de Mós, com o objectivo de combater a solidão e o isolamento social de pessoas idosas.
Para já, são acompanhados 45 beneficiários, residentes nas freguesias de Juncal e Pedreiras, mas a ambição da instituição é chegar aos 100 utentes e abranger outros pontos do concelho, avança Lúcio Alves, director de serviços do CPAJ.
A iniciativa partiu de três jovens – Patrícia Rebelo, Bárbara Morgado e Joana Durão – técnicas que operam na área social na instituição, com o objectivo de, por um lado, “complementar” o serviço de apoio domiciliário e, por outro, chegar aos idosos que ainda não estão institucionalizados e que vivem sozinhos, prestando-lhes apoio social, cognitivo e psicológico.
Bárbara Morgado, técnica de serviço social, explica que o projecto contempla visitas domiciliárias, realizadas uma vez por semana, com actividades do “foro cognitivo, motor e psicológico”.
“Mais do que a presença física, trata-se de criar laços e garantir que estas pessoas não se sentem esquecidas ou invisíveis. Ouvir é metade do nosso trabalho”, frisa a técnica, adiantando que, nessas visitas, além da escuta, são desenvolvidos jogos sensoriais e de estimulação cognitiva, com o objectivo de “trabalhar as competências” que os utentes ainda têm.
Também semanalmente há um dia aberto, que junta os participantes do projecto num espaço cedido pela comunidade – Casa do Povo das Pedreiras e União Recreativa e Desportiva Juncalense -, para actividades conjuntas e “dinâmicas de grupo”, como aquela que o JORNAL DE LEIRIA acompanhou na passada segunda-feira.
Desta vez, e tendo como mote o Dia dos Avós, assinalado a 26 de Julho, parte da actividade contou com a presença das crianças do pré-escolar do CPAJ.
Tirar as pessoas de casa
Entre o grupo está Maria Paulino, que, dentro de dias, completará 95 anos. Conta que ainda trata da “lida da casa”, tarefas que intercala com a leitura, num esforço de manter os dias ocupados. Mas, assume, falta-lhe companhia. Sem filhos, vive sozinha desde a morte do marido, há 27 anos. Pelo que, quando lhe falaram do Abraço de Ouro, quis experimentar.
“Desafiaram-me e comecei a vir [aos dias abertos]. Agora, venho todas as semanas. É um bom projecto para tirar as pessoas de casa e pô-las a conviver com outras”, afirma Maria Paulino, a mais velha do grupo, mas “a mais valente e a mais gaiteira”, afiança Lurdes Virgílio, de 74 anos, que tomou conhecimento da iniciativa na missa, através de “um aviso do senhor padre”.
Três meses depois, sente-se “agradecida” ao projecto por lhe proporcionar momentos de “convívio” e a oportunidade de “conversar, de ser ouvida e de aprender”. “Saímos da rotina. Venho sempre com a esperança de passar um dia um pouco melhor, com mais alegria. E é isso que acontece”, acrescenta Rosário Rosa, de 77 anos, que foi encaminhada para o projecto através da médica de família, no âmbito de uma parceria entre a Unidade de Saúde Familiar Novos Horizontes e o CPAJ.
Bárbara Morgado refere que, “quando os médicos percebem que pode haver vantagem para os utentes, falam-lhes do projecto e recomendam-no”. No entanto, “a escolha e a decisão é sempre da pessoa”, ressalva a técnica, adiantando que a sinalização é feita também pelos lares do Juncal e da Cruz da Légua, juntas de freguesia, pessoas da comunidade ou famílias. Trata-se de um trabalho de “complementariede”, envolvendo as várias instituições, acrescentam Joana Durão e Patrícia Rebelo.
É nessa estratégia de trabalho “em rede e em parceria” que entra Rita Nascimento, de 19 anos, voluntária no projecto. A estudar Direito em Lisboa, disponibilizou- -se para colaborar e ficou rendida. “Estou mesmo apaixonada. Percebemos, pelo feedback que nos dão, que estamos a contribuir para o bem-estar destas pessoas. A nível individual também sinto que me faz bem este contacto com outra geração”, partilha a jovem.