A sala enche-se de rapazes que, silenciosamente, escutam orientações e assistem a vídeos. Os adolescentes são todos jogadores de futebol da União Desportiva da Serra e a sua atenção está focada na formação sobre Integridade, Ética e Direitos Humanos, dinamizada por técnicos da Associação de Futebol de Leiria.
Em análise estão os impactos, a destruição de carreiras profissionais por quem arriscou fazer apostas em jogos da sua equipa ou até da modalidade, quem embarcou em partidas de resultados combinados. Mas também reflexões sobre a falta de cultura desportiva, que leva ao desrespeito entre jogadores ou entre assistência e atletas, sobre o dever de respeitar todos os desportistas, independentemente da sua religião, cor ou orientação sexual.
Entre o público está Martim Oliveira, de 13 anos, que repete a formação e sempre [LER_MAIS]aprende algo mais em cada sessão. Tristemente, alguns dos temas abordados são-lhe familiares, como é o caso das ofensas que, das bancadas, alguns pais proferem sobre os jogadores. “É frequente, mas ainda me deixa zangado”, conta Martim. Já Guilherme Carreira, de 13 anos, ficou particularmente interessado em ver um filme de comédia referido na sessão. Garante que vai assistir ao Campeones em sua casa.
“É cómico e é sobre desporto”, características que o deixam empolgado. E Tomás Ribeiro, de 13 anos, que já tinha sido avisado sobre o risco do vício do jogo, pelos pais, compreendeu, através desta formação, que existe também incompatibilidade entre apostas e a carreira futebolística.
Luís Monteiro, secretário-geral da Associação de Futebol de Leiria, e André Vieira, gestor de processos de certificação, são ambos responsáveis pela dinamização das formações sobre Integridade, Ética e Direitos Humanos que acontecem no distrito. Em causa está uma formação que é obrigatória para todos os clubes que se encontrem em processo de certificação para obtenção de três, quatro ou cinco estrelas.
Além desta, são necessárias outras: Ética para os Pais, Nutrição e Leis de Jogo, contextualiza André Vieira.
No caso concreto das sessões sobre Integridade, Ética e Direitos Humanos são destinadas aos sub 15, jogadores de futebol e de futsal. “Estamos focamos neste primeiro escalão de competição, para que os jovens saibam, logo no primeiro momento competitivo, o que podem e não podem fazer. É uma acção de prevenção”, prossegue o técnico.
Um trabalho de insistência
Estas sessões tiveram início em 2020 e, em cada distrito, os resultados são reportados à Federação Portuguesa de Futebol. “Na época passada, 2023/2024, efectuamos 31 sessões junto dos clubes candidatos a três estrelas na certificação, para 781 jovens”, contabiliza Luís Monteiro.
“Sabemos que estamos a fazer um trabalho de insistência junto dos clubes, para que passem a palavra a amigos e aos pais. E, além destes clubes, que acedem à formação, com a pretensão de alcançar a certificação de três ou mais estrelas, também já fomos solicitados por escolas e autarquias”, prossegue o secretário-geral. “Se os pais quiserem assistir, também podem”, observa André Vieira. “Hoje em dia paga-se mensalidade para tudo, seja futebol, balé, ténis ou basquetebol. E os pais entendem que o filho vai ser o seu Ronaldo, o seu garante financeiro no futuro. Isto faz com os que miúdos, ao fim de três ou quatro anos se saturem da prática desportiva.
Pedro Batista, União Desportiva da Serra
Efeitos notórios entre atletas
Pedro Batista, director financeiro da União Desportiva da Serra, não tem dúvidas sobre o alcance desta formação. “Somos concorrentes à certificação de três estrelas, o que pressupõe várias formações, uma das quais sobre Integridade, Ética e Direitos Humanos. É uma formação que tem impacto. Traduz-se no convívio, na relação que os jovens têm entre si e no respeito para com superiores, para com a arbitragem dentro do campo”, observa Pedro Batista. “E é importante para que os pais percebam que isto é um jogo, uma diversão, e não uma batalha campal”, prossegue o dirigente, para quem, independentemente da obtenção da certificação, esta já é uma causa ganha.