Se depois do incêndio de Pedrógão Grande já se sabia que nada seria igual, após o fogo do dia 15 de Outubro, que consumiu 86% do Pinhal de Leiria, atingindo casas e empresas em três concelhos do distrito, tudo tem mesmo que ser diferente.
Percebendo que (quase) tudo falhou na Protecção Civil na época de incêndios, o Governo sentou-se à mesa, sábado, durante 11 horas para discutir a reforma nos sistemas de prevenção e combate aos incêndios e adoptar medidas de emergência de apoio às vítimas, depois dos incêndios de Pedrógão Grande (17 de Junho) e da zona Centro (15 e 16 de outubro), que provocaram a morte a mais de 100 pessoas e deixaram um rasto de destruição de casas, empresas e património florestal.
Na reunião extraordinária do Conselho de Ministros foi aprovada a Estratégia Nacional de Protecção Civil Preventiva, que define como "essencial" aproximar a prevenção e o combate aos incêndios rurais e como "prioritário" reforçar o profissionalismo e capacitação em todo o sistema. Algumas medidas aprovadas passam pelo papel reforçado das forças armadas, atribuir a gestão dos meios aéreos à Força Aérea e profissionalizar o modelo de combate aos fogos.
Artur Figueiredo, comandante dos Bombeiros Municipais de Leiria, aplaude algumas destas medidas e considera “fundamental” um “planeamento permanente” do dispositivo, uma vez que as condições climatéricas estão, cada vez mais, severas.
Salientando a importância da primeira intervenção para impedir que pequenos focos de incêndio se transformem em gigantes fogos, o comandante defende uma actualização constante das condições meteorológicas para que seja possível adequar convenientemente o dispositivo.
“Cada vez mais os incêndios têm uma evolução muito rápida e atingem grandes proporções num curto espaço de tempo, o que dificulta o combate. Nunca tínhamos sentido fogos com a violência dos deste ano. O período de seca que estamos a atravessar potencia a ocorrência de violentos incêndios com grandes projecções e ondas de calor intenso, o que acontece mesmo junto à orla marítima”, acrescenta o comandante.
Para Artur Figueiredo, as Forças Armadas “podem ter um papel fundamental na vigilância, patrulhamento, gestão das comunicações e no apoio ao combate”, sendo mais um parceiro na primeira intervenção, “desde que lhes sejam facultados meios”.
O comandante também concorda que “a coordenação e a operacionalização dos meios aéreos sejam entregues à Força Aérea”, com os equipamentos e formação adequadas “para que possam desempenhar da melhor forma a missão que lhes é atribuída”.
[LER_MAIS] “A principal vantagem é que se os meios aéreos estiverem na Força Aérea estarão disponíveis ao longo do ano e podem intervir em qualquer altura”, salienta Artur Figueiredo, que considera os aviões como um dos principais aliados no início do combate aos fogos. “A primeira intervenção tem de ser rápida e musculada e o apoio dos meios aéreos é fundamental neste momento.”
Voluntários com “excelente” formação
O Governo quer criar em cada associação humanitária de bombeiros voluntários das zonas de maior risco de incêndio, equipas profissionais com bombeiros formados na escola de bombeiros, que será integrada no sistema formal de ensino, enquanto escola profissional.
Enaltecendo a formação dos bombeiros voluntários, o comandante dos Municipais defende que seja possível criar mais equipas de intervenção permanente (EIP) em todos os quartéis dos voluntários. Poder-se-á chamar profissionalização.
Artur Figueiredo sublinha que “os voluntários complementam o trabalho dos profissionais e devem continuar a existir”, mas é necessário garantir a disponibilidade imediata de mais elementos “para garantir um socorro mais rápido e eficaz”.
O comandante lembrou que os incêndios rurais são apenas cerca de 4% das ocorrências no concelho de Leiria e que mais operacionais são necessários ao longo de todo o ano. “A formação dos voluntários é excelente e estão preparados para desempenhar qualquer função de bombeiro”, reforça Artur Figueiredo, acreditando que a sua profissionalização seria uma mais-valia.
No próximo Verão, os concelhos que integram a Comunidade Intermunicipal da Região de Leiria (CIMRL) irão garantir a instalação de câmaras de videovigilância em locais estratégicos de cada concelho.
O projecto de Videovigilância para Apoio à Detecção e Combate de Incêndios Florestais visa a complementariedade da torre de videovigilância da serra dos Candeeiros (torre já existente), a instalação de oito novas torres por forma a alargar a cobertura a todo o território da CIMRL e a modernização dos dois Centros de Gestão e Controlo (GNR de Leiria e CDOS Leiria).
Para Artur Figueiredo, esta tecnologia será outra aliada da Protecção Civil na prevenção e combate aos incêndios. “Além de garantirem uma vigilância 24 horas por dia, durante todo o ano, as câmaras serão fundamentais não só na detecção de incêndios como no apoio às operações. Possibilitam uma intervenção mais rápida, evitam falsos alarmes e dão indicações mais precisas sobre os locais das ocorrências ou para onde se está a dirigir o fogo”, explica.
Estes equipamentos têm um alcance entre 15 a 20 quilómetros e fazem uma rotação de 360 graus, o que “permite ter o território da CIMRL praticamente todo coberto”. O Governo pretende retomar a expansão das companhias dos Grupo de Intervenção Protecção e Socorro (GIPS) da GNR.
“Os GIPS têm um papel importante na fiscalização à gestão de combustível junto às habitações e que sensibiliza os proprietários para a limpeza que deve ser feita. Constatámos que onde esse trabalho é feito não ardeu praticamente nenhuma habitação”, realça Artur Figueiredo, considerando que esta acção deve ser reforçada. O comandante entende ainda que os guardas florestais tinham uma missão de prevenção, através da “manutenção das matas” e que a sua acção permanente seria eficaz.