O Decreto-Lei n.º 31/2020, de 30 de Junho, criou o Sistema de Informação de Manifesto de Corte (SiCorte), para regular e rastrear toda a madeira cortada em Portugal.
O sistema prometia um regime do manifesto de corte, corte extraordinário, desbaste ou arranque de árvores e a rastreabilidade do material lenhoso, através de uma plataforma digital, fácil de utilizar e acessível no sítio na Internet do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).
O registo deveria ser realizado pelos madeireiros “e os demais operadores envolvidos na aquisição das árvores”, quer se tratasse de transporte, de armazenamento ou primeira transformação da madeira, resultante de colheita normal, incêndio, razões fitossanitárias ou desbaste, destinado à indústria nacional ou à exportação.
A lei, transposta da legislação europeia, obriga à declaração prévia ao ICNF, através do SiCorte de qualquer operação relacionada com a remoção de espécies florestais, “ao longo da cadeia de abastecimento do material lenhoso até à primeira transformação”.
E qual é a utilidade de tal registo para a fileira, para o ordenamento do território ou para a gestão do sector?
“Não é clara. O SiCorte condiciona o comércio, apenas se tem de informar o sistema, para que a informação fique registada e rastreável, do início ao destino da madeira. Não se pode circular com a madeira, sem o registo no SiCorte e sem factura, sob pena de coimas pesadas”, explica o presidente da Associação das Indústrias de Madeira e Mobiliário de Portugal (AIMMP).
Vítor Poças socorre-se de outro produto para esclarecer melhor.
“É como se existisse um sistema de rastreabilidade de maçãs. Onde foram colhidas e onde foram distribuídas e comercializadas. Serve para quê?”
O objectivo não é claro e, na verdade, neste momento o SiCorte não está a funcionar, após várias críticas de operadores do sector.
“Resumindo, a lei está cá fora desde 2020, não foi criada a plataforma digital e não se podia cumprir a lei, embora a polícia exigisse um registo impossível de fazer. Foi tudo suspenso”, conta Poças.
O presidente da Associação das Indústrias de Madeira e Mobiliário de Portugal afirma que o SiCorte foi além daquilo que estava plasmado nas directivas comunitárias e entrou “tecnicamente em vigor”, ainda sem concluir a componente digital, que tinha sido iniciada em parceria com os técnicos da AIMMP, mas cujo “contributo não foi respeitado”.
Sem plataforma, o ICNF criou uma “folha Excel” que “não ficava registada em lado algum”, mas que tinha de ser impressa antes de os camiões iniciarem a marcha.
“Não servia para nada. Os camiões, na mata, não têm PC, nem impressoras e nem houve formação. Não funcionou!”
Entretanto, o ICNF contratou uma empresa para criar a parte digital de registo do SiCorte. A primeira versão foi elaborada sem a apreciação de associações como a AIMMP ou a Celpa.
Agora, dois anos depois da entrada em vigor do Decreto-Lei, a empresa, o ICNF e as associações entraram, mais uma vez, em conversações para tentar melhorar o SiCorte.
Excedente fará descer valor
Em relação ao que fazer com as toneladas de madeira queimada, este ano, em fogos rurais, Vítor Poças alerta que é inevitável que o preço do metro cúbico baixe, apesar das medidas anunciadas pelo Governo para o sector. São as regras do mercado.
“Se a floresta arde e passa a haver um excedente de matéria-prima, o valor desce!”
O empresário afiança que, apenas com uma retirada integral de rendimento da floresta, com espécies de maior valor e utilização da quase totalidade dos materiais produzidos, se poderá evitar incêndios e que a silvicultura nacional perca valor. Isto é, é necessária maior competitividade no sector a nível internacional.