Depois de um evento agudo cardíaco, uma das principais preocupações é evitar um novo episódio. O Hospital de Santo André, do Centro Hospitalar de Leiria, criou há cinco anos a Unidade de Reabilitação Cardíaca, que tem vindo a reduzir a mortalidade cardiovascular e as readmissões hospitalares. As mudanças de hábitos e comportamentos dos utentes são conseguidos através de um programa, que tem uma duração entre oito e 12 semanas, e que incentiva os utentes à prática do exercício físico e um estilo de vida saudável.
Entre os 150 doentes que já passaram por esta unidade, há a lamentar três óbitos, dois dos quais por terem patologias “graves” e outro por incumprimento das recomendações. “Está provado que a reabilitação cardíaca bem feita consegue ter um impacto na redução da mortalidade e de novos enfartes igual ou superior a qualquer medicamento de ponta ou até tratamentos mais agudos, como as angioplastias”, diz Alexandre Antunes, coordenador da Unidade de Reabilitação Cardíaca do CHL, acreditada pela Sociedade Europeia de Cardiologia.
Américo Rosinha, 68 anos, teve um enfarte em Dezembro. Esteve nos cuidados intensivos e recuperou. É um dos utentes que frequentam o programa e resume o bem-estar que sente: “É importante para o resto da vida”. “Saio daqui mais motivado para manter uma vida saudável no dia-a-dia. Passei a fazer mais caminhadas e a cumprir uma alimentação mais saudável”, conta. O programa tem uma componente educativa que pretende ajudar os utentes a melhorar os seus hábitos de vida, desde a prática do exercício físico, à gestão do stress e ansiedade e alimentação.
“Agora, cada vez que pego num bolinho já penso no açúcar e na gordura que possui. Antes não tinha a mínima preocupação, talvez por isso é que tive o enfarte”, constata Américo Rosinha, de Leiria.
Pedro Quintas, 43 anos, sofreu um enfarte em Janeiro. Enfermeiro de profissão, não duvida de que a reabilitação é uma “mais-valia” para o futuro. “Não é só a mentalização do doente, mas também a mudança do estilo de vida”, acrescenta, ao destacar a importância da aplicação Movida Eros, concebida em parceria com o Politécnico de Leiria, que monitoriza o exercício físico do utente.
“O que está provado é que são precisas 8 a 12 semanas para haver eficácia. Depois procuramos que o doente continue a ter uma ligação à nossa equipa para manter a motivação. A aplicação móvel permite prescrever o exercício e irmos acompanhando”, explica Alexandre Antunes.
Sempre que o utente inicia o exercício, a aplicação é activada e os profissionais de saúde conseguem monitorizar. Sendo interactivo, o utente pode comunicar se se sentiu mais cansado ou teve dores no peito. “Se vemos que não está a ser muito assíduo também mandamos uma mensagem a incentivá-lo. Há muitas pessoas que é graças à app que continuam a exercitar- se”, aponta o especialista.
Pedro Quintas garante que melhorou os seus hábitos de vida, passou a fazer mais actividade física e perdeu peso. O programa contribuiu para o ajudar a “relativizar as coisas, sobretudo no trabalho”. “É na tentativa de melhorar toda esta doença crónica, e consequentemente todas as implicações sociais, que nasce a reabilitação cardíaca. É um programa que pretende ajudar os doentes a mudar o ‘chip’”, explica Alexandre Antunes.
O doente recebe informação sobre os factores de risco, como os controlar, o que é a aterosclerose ou quando é que acontece o enfarte e depois é-lhe prescrito um plano de exercício, que é realizado nas sessões no pequeno ginásio da unidade.
“Cada doente é avaliado de forma personalizada e depois é desenhado um programa de exercício”, afirma o cardiologista.
Sob monitorização presencial, o médico segue os valores dos batimentos cardíacos e pulsação. “À medida que a pessoa adquire o hábito de se exercitar vai ficar mais autónoma, com mais capacidades, mais confiante e com menos probabilidades de voltar a ter um enfarte”, assegura Alexandre Antunes. A gestão do stress, que em excesso provoca doença, nomeadamente cardiovascular, é ‘ensinada’ através de sessões com um “profissional habilitado”.
Uma equipa multidisciplinar “ajuda a tratar o doente da forma mais holística e rápida” nas outras comorbilidades que os utentes possam ter e que “acabam por afectar o aparelho cardiovascular ou até o bem-estar geral”.
“No fim deste programa pretendemos ter um doente mais informado, mais exercitado, mais relaxado e a lidar melhor com o stress”, afirma o cardiologista, lamentando que os doentes activos profissionalmente tenham maior dificuldade em aderir ao programa, por incompatibilidade laboral.