Amanhã, dia 8 de Dezembro, sexta-feira, a SAMP – Sociedade Artística Musical dos Pousos, celebra 144 anos de actividade ininterrupta.
A colectividade foi fundada em 1873, numa noite de Verão, na casa do Barão de Viamonte, homem de letras, agricultor, administrador do concelho, jornalista e advogado, nascido no Porto e casado em Leiria.
Passavam 22 dias do início de Agosto e a seu lado estava o grande amigo e sócio-fundador Eça de Queirós. Para as fileiras da “sua” filarmónica, recrutou agricultores e empregados nas suas propriedades rurais, o sal da terra com que haveria de temperar as mentes de Leiria, pouco habituadas a ver o povo a desempenhar semelhante acto de amor pelas artes.
“Morreu novo o seu filho único, pelo que não teve descendência. Mas, se morreu o filho de sangue, não morreu a filha de coração, a SAMP. Não parou de crescer esta filha, e de uma filarmónica casada com tantos pousenses e leirienses, nasceram filhos, netos e hoje já bisnetos e bisnetas. Uma das netas mais atrevidas viria a nascer no dia 3 de Outubro de 1992, a Escola de Artes, de que este ano celebramos os seus 25 anos”, recorda Paulo Lameiro.
Uma “grosa de anos”
O director artístico da SAMP conta que foi também por um acto de amor que muitos voluntários, direcções e colaboradores, dezenas de professores e centenas de amigos, de parceiros e milhares de alunos e suas famílias levaram os seus bebés, para um contacto inicial com a primeira de todas as artes, e aprenderam a dançar e a tocar instrumentos, na Escola de Artes.
“Nestas Bodas de Prata, queremos deixar a nossa gratidão, pelo orgulho que oferece a todos os ‘viamontes’, a todos os que amam a arte dos sons e a arte do amor.”
“Este ano, a comunidade nacional reconheceu o caminho trilhado pela filarmónica dos Pousos, de 1873 à actualidade. A Fundação Calouste Gulbenkian atribui-lhe o Prémio COESÃO 2017, e a Ageing@ Coimbra, com a CCDR, acaba de a distinguir com oPrémio Vida+ de Boas Práticas no Envelhecimento Activo e Saudável”
A celebração contou com vários momentos, para onde foram convidados antigos alunos da instituição e os seus filhos e filhas, que são, agora os actuais discípulos da SAMP. O convite foi estendido aos primeiros bebés do Berço das Artes e foi criada uma exposição comemorativa com artigos na imprensa sobre a instituição.
Em 2017, além do aniversário da sua Escola de Artes, a SAMP celebra aquilo a que Paulo Lameiro baptizou de “uma grosa de anos”. E o aniversário, até agora, tem sido especial. “Este ano, a comunidade nacional reconheceu o caminho trilhado pela filarmónica dos Pousos, de 1873 à actualidade.
A Fundação Calouste Gulbenkian atribuilhe o Prémio COESÃO 2017, e a Ageing@Coimbra, com a CCDR, acaba de a distinguir com oPrémio Vida+ de Boas Práticas no Envelhecimento Activo e Saudável. E houve a edição de um CD duplo com os melhores temas para cantar com pais e bebés, do Berço das Artes.”
Por terras dos Pousos, a arte é vista como “como motor da inovação social”, ao serviço das comunidades, tendo como substrato os recursos humanos e materiais da instituição regeneradora e progressista, tal como o fundador, a SAMP esteve presente na implantação da República em Portugal, saindo para as ruas de Leiria, para celebrar a mudança de regime, lutou e inovou para encontrar soluções para as crises das duas Grandes Guerras do século XX, para a emigração maciça da segunda metade do século passado, e para a Guerra Colonial em África.
Musicoterapia e programas inter-geracionais Na sede da SAMP, foram criadas orquestras, uma [LER_MAIS] biblioteca, grupos de teatro e de variedades, houve projecção das mais populares fitas do cinema e actividades recreativas, sempre com o intuito de facultar o acesso às artes e à cultura a quem não vivia na cidade.
Dobrado o cabo do milénio, a instituição continuou a procurar novas valências e a dar forma a novos projectos, sempre com as artes no horizonte. “A musicoterapia, os programas inter-geracionais, a música na comunidade, as práticas artísticas colectivas e as classes de pais e filhos, são somente alguns exemplos de respostas inovadoras para novos problemas”, ilustra Lameiro.
Mas, se a Sociedade Artística Musical dos Pousos foi constituída a 22 de Agosto, por que razão se celebra este aniversário no dia 8 de Dezembro? Foi nessa data, fará amanhã 144 anos, que o Barão de Viamonte ofereceu uma prenda de Natal antecipada: instrumentos de sopro e percussão ao grupo que haveria de formar a Banda Filarmónica dos Pousos.
Hugo Alves, presidente da SAMP: "temos o paradigma de trabalhar as pessoas à volta dos alunos"
Ocupa o cargo de presidente da Sociedade Artística Musical dos Pousos, desde Março. Que balanço faz do trabalho desenvolvido nestes meses?
Por ter 144 anos, a SAMP é uma casa que tem muitas histórias, memórias e projectos. E, efectivamente, devido à quantidade de iniciativas e o ritmo de funcionamento da instituição do ponto de vista de inovação social, é difícil a uma Direcção que não é profissional, como a nossa, acompanhar, atentamente, tudo o que acontece. Neste momento, já conseguimos ter uma atenção especial nos projectos onde há maior intervenção, mas a SAMP não pode estar dependente das Direcções, para fazer a sua actividade normal.
Quer dizer que a instituição funciona através de núcleos de trabalho dedicados a diferentes projectos?
À cabeça, está Paulo Lameiro, o director artístico, que é o grande "motor" da SAMP, e há várias outras áreas como o atendimento dos pais e dos alunos, contabilidade, comunicação e projectos da escola e projectos especiais, que têm um conjunto de pessoas especializadas à sua frente. São elas o coração que faz funcionar, todos os dias, a SAMP.
A vocação artística da Escola de Artes da SAMP, que fez agora 25 anos, e da própria SAMP é um sinal da vitalidade das artes na região?
Quando a SAMP apareceu, há 144 anos, foi criada por um conjunto de pessoas, de agricultores e pequenos trabalhadores rurais que necessitavam de algo que não fosse apenas o trabalho do quotidiano. Já nessa época, foi a arte a estar por detrás desse esforço de criar uma filarmónica e a instituição começou logo, nesse momento, a intervir na sociedade, através da música. De forma gratuita, começou-se a formar os alunos da banda, que eram ensinados pelos músicos mais antigos e experientes. Esta tentativa de intervenção na sociedade através das artes, também esteve, há 25 anos, por detrás da fundação da Escola de Artes. E falar nesta escola, faz-nos a falar das iniciativas que são feitas desde o berço, porque isso leva a uma intervenção na sociedade: os pais têm, obrigatoriamente, de participar na aula de berço, com os filhos. É uma forma de educar as famílias, através dos mais novos. Na SAMP, temos o paradigma de “trabalhar” as pessoas à volta dos alunos. Isso também se vê, noutras iniciativas, como a que trabalha com idosos num lar, ou mesmo com o Ópera na Prisão, onde além dos detidos, também se intervém junto dos funcionários prisionais.
O Pinhal das Artes é um dos projectos que está indelevelmente ligado à SAMP. Foi suspenso há alguns anos, com a promessa de que iria haver um outro evento que pegasse nessa tradição. Vai ser em 2018?
Esse é um projecto que jamais deixou de estar na nossa cabeça. Estamos a tentar encontrar outro local onde se possa realizar um evento semelhante ao Pinhal das Artes, e, simultaneamente, descolar-nos daquilo que foi esse festival de artes para a primeira infância. Não podemos criar uma simples cópia porque ela iria funcionar mal. Queremos algo novo. É por isso que andamos, com a ajuda das autarquias, à procura de espaços mas tem sido uma tarefa difícil e ainda não encontrámos um. Porém, é um facto que o incêndio no Pinhal de Leiria abriu uma oportunidade, onde se começou a falar da possibilidade de se voltar a fazer o Pinhal das Artes. Quando se tomar uma decisão terá de ser em conjunto com todos os parceiros envolvidos. Mas não vai ser em 2018 que haverá o Pinhal das Artes.
Perfil
“Há coisas a que não se consegue dizer não”
Hugo Alves, gestor de profissão, tem 40 anos e três filhos. em mandatos anteriores, pertenceu ao Conselho Pedagógico da SAMP. "Nos últimos mandatos, a regra para a escolha das Direcções é que as pessoas têm de frequentar a SAMP, do ponto de vista da fruição artística. Não basta ser-se sócio. Quando o mandato da anterior equipa estava a chegar ao final, foi feita uma análise e sondagem de possíveis candidatos e foi assim que me tornei presidente da Sociedade Artística e Musical dos Pousos", recorda, adiantado que "há coisas a que não se consegue dizer não".