«When I write children’s fiction, I write for two people, myself, age 12, and myself, now, and the book has to satisfy two distinct but connec ted appetites. My 12-year-old self wanted autonomy, peril, justice, food and above all a kind of density of atmosphere into which I could step and be engulfed. My adult self wants all those things, and also: acknowledgments of fear, love, failure. So what I try for when I write is to put down in as few words as I can the things that I most urgently and desperately want children to know and adults to remember.» Katherine Rundell, autora inglesa de livros infantis, The Guardian, 26/7/2019
W. H. Auden, um dos mais notáveis poetas americanos, escrevia num texto dedicado a Lewis C arroll: “Há bons livros destinados apenas a adultos porque a sua compreensão pressupõe vivências adultas, mas não há bons livros que sejam apenas para crianças”.
Uma das experiências inesperadas que vivi com a maternidade foi o regresso à literatura infantil.
A universidade e a vida profissional mantiveram-me durante muitos anos afastada desse universo ainda que, nas regulares viagens às livrarias, os olhos parassem sempre nas edições dos livros que me povoaram as primeiras leituras e cujos contornos, viria a perceber já mais tarde, não eram exclusivamente infantis.
Comecei muito cedo a ler em voz alta para a minha filha e, confesso, sob esse pretexto adquiri o secreto hábito de lhe comprar livros sendo eu quem realmente queria lê-los.
Foi assim que começou, devagarinho, o meu regresso a essas páginas onde já todas as grandes questões que atravessam os dias, jovens ou adultos, são relatadas ainda sem as cautelas e os entraves colocados à imaginação à medida que os anos se acumulam – o bem, o mal, a justiça, a coragem, a solidão, o medo, a amizade, o amor, a alegria, as perdas e a esperança.
Foi numa dessas visitas mais ou menos mal assumidas às estantes infantis que descobri a obra do escritor chinês Jimmy Liao (a sua obra é publicada em Portugal pela editora Kalandraka).
A vida de Liao e as razões [LER_MAIS] pelas quais escreve e ilustra livros infantis resume-se em muito poucas palavras. Liao trabalhava (muito) em publicidade e adoeceu gravemente com uma leucemia. Recuperou.
Decidiu deixar o seu antigo emprego para se dedicar (ou talvez salvar-se) à escrita e à ilustração de livros para crianças. As suas obras estão hoje traduzidas em muitos países e têm sido vários os prémios que tem recebido.
Reservo-vos a surpresa de o descobrirem caso tenham o impulso de o conhecer mas não posso deixar de mencionar os dois primeiros livros que me conduziram ao deslumbramento com a sua obra que sigo desde então de muito perto.
Um livrinho intitulado Desencontros, que diz em muito poucas palavras como a voz do acaso, da sorte ou da ausência dela nos pode ditar o rumo dos dias sem esquecer a capacidade de espanto; e um outro com o título Noite Estrelada, que resume, mais nas belíssimas ilustrações que remetem para Van Gogh e Magritte do que no texto, como um breve encontro nos pode resgatar da solidão e de como a memória da beleza nos pode devolver a esperança.
*Assessora de imprensa