Mal se entra, sente-se um odor desagradável, que se intensifica à medida que vamos penetrando na casa. No vão das escadas que dão acesso ao primeiro andar há um colchão e um amontoado de roupa, que indiciam que o local serve de ‘quarto’ a alguém. Dizem-nos que por este espaço é cobrada uma renda de 100 euros.
No primeiro piso, a maioria das portas está fechada e sem ocupantes. A comitiva da candidatura do Bloco de Esquerda à Câmara, de visita (ver caixa) a esta habitação – localizada no centro histórico de Leiria e que acolhe pessoas em situação de carência extrema apoiadas pela Segurança Social -, já tinha advertido que era expectável que assim fosse.
“Soube-se da nossa vinda e as pessoas, como têm receio de represálias, não querem dar a cara”, contextualiza Luís Silva, o cabeça-de-lista do BE.
No piso superior viverão sete pessoas, três delas em cubículos com menos de quatro metros quadrados. Pela brecha de uma das portas, vê-se um colchão no chão e, mesmo ao lado, uma botija de gás.
No espaço comum, há um frigorífico e os despojos de um fogão. Passando um corredor, têm-se acesso à casa-de-banho que serve para todos os ocupantes, com vidros danificados onde foi colocado cartão a tentar remendar os buracos. [LER_MAIS]Nas paredes e no tecto são bem visíveis os sinais de humidade e de infiltrações.
O cenário dos sanitários repete-se no andar de baixo, onde está afixado um papel manuscrito com as regras de funcionamento: “Banho às terças- -feiras, das 11 às 5 [17] horas, às sextas-feiras, das 8 às 2 [14] horas”. Pede-se ainda o “favor” de não utilizar água quente para lavar a roupa manualmente. A máquina de lavar roupa está fechada a cadeado.
“Só podemos usar uma vez por mês”, confidencia um dos ocupantes da casa. Um outro, acaba por lamentar a falta de condições do espaço, para onde diz ter sido foi encaminhado pelos serviços da Segurança Social.
“Estou aqui por intermédio deles e a renda é com eles”, revela o morador, que, em tom conformado, acaba por se dizer “satisfeito” por ter um espaço com tecto onde dormir. “Quando é oferecido, não se pode contestar.”
Maria (nome fictício) conta que já foram pedidas melhorias à proprietária, mas que de nada tem valido. “Chove nos quartos. Num, chove como na rua”, desvenda, queixando-se ainda do frio do Inverno.
Nas poucas palavras que troca com a comitiva, Maria confessa que gostava de ter “melhores condições”, mas “tem de ficar para não ir parar ao meio da rua”.
Ao que o JORNAL DE LEIRIA apurou, há rendas de 100, 130 e 140 euros cobradas pelos quartos.
Confrontada com a situação, a vereadora da Acção Social, Ana Valentim, diz que “o Município de Leiria entende que deve ser a entidade responsável pelo encaminhamento dos residentes para aquela resposta habitacional a pronunciar-se sobre o assunto”.
A vereadora refere ainda que os técnicos da autarquia “estiveram esta terça-feira no local” e que o município se encontra “totalmente disponível para ajudar a diligenciar outra resposta habitacional para os residentes”.
Ao JORNAL DE LEIRIA, o Instituto da Segurança Social nega que o seu Centro Distrital de Leiria (CDL) encaminhe, directamente, pessoas para a casa em questão. “Sempre que os cidadãos revelam necessitar de apoio ao nível do alojamento podem ser referenciadas estruturas tipo pensão/hostel devidamente certificadas, de baixo custo, existentes no concelho de Leiria, que são, posteriormente, seleccionadas pelos próprios utentes”, alega a instituição.
Nessa nota, é ainda referido que CDL da Segurança Social “desconhece as condições referidas e vai reportar a situação às entidades competentes”. O JORNAL DE LEIRIA tentou, sem sucesso, chegar à fala com a proprietária da casa.