O facto de a Standard& Poor´s ter subido a nota que dava a Portugal – passando-a de “lixo” para grau de investimento – no mesmo dia em que o Fundo Monetário Internacional (FMI) publicou um relatório sobre Portugal fez com que os holofotes mediáticos se afastassem de um alerta importante: o de que é preciso ter atenção com a factura da Função Pública.
Sim, o facto de a S&P ter galgado dois degraus de uma só vez (a expectativa era a de que mudasse apenas a perspectiva, que funciona como um sinalizador do passo a seguir) é uma excelente notícia e acelera a entrada de novos investidores, e também o FMI reconheceu que há um “progresso notável”.
Mas também é verdade que se evitam futuros problemas quando se actua no presente. E como o FMI tinha também dois alertas, um sobre a banca (ainda com fragilidades e novos desafios regulatórios) e outro sobre a Função Pública.
De acordo com o Fundo, é preciso diminuir o número de trabalhadores pagos pelo Estado e, também, evitar subidas de salários. Depois, entre outros aspectos, recorda que, “nos dois últimos anos, Portugal não reduziu o emprego público como tinha planeado para compensar os custos associados à reversão dos cortes salariais”.
A falha, se é que o Governo acreditava verdadeiramente nas metas estabelecidas, verificou-se nas reformas, que ficaram muito abaixo do que previa o executivo.
No cômputo global, não só não houve descida no número de funcionários – o plano previa uma redução de dez mil entre 2015 e 2016 – como até se registou uma tendência de subida.
Isto numa altura em que se está a debater o descongelamento das progressões dos funcionários do Estado, e o volume de trabalhadores vai subir com a integração dos precários.
Não coloco em causa a reversão dos cortes salariais, medida aliás considerada inconstitucional, ou a plena justiça de se acabar com os falsos recibos verdes.
Interrogo-me, isso [LER_MAIS] sim, sobre o que é que está a ser feito para saber que Função Pública temos, e queremos, para perceber então de que forma cortamos despesa ou justificamos o encargo.
Em 2013, pleno período da troika de credores, tentou-se fazer um levantamento dos complementos salariais pagos aos trabalhadores. E digo tentou-se porque o trabalho ficou incompleto, por falta de dados disponibilizados pelas empresas ligadas à administração central, regional e local.
Umas nem responderam, outras deram dados parciais e houve ainda casos de incorrecções e incongruências. Mas não consta que tenha havido penalizações por isso, nem que a questão tenha sido resolvida desde então.
O problema, aliás, começa no facto de nem sabermos o verdadeiro universo da Função Pública. No Orçamento do Estado para 2017, o actual Governo dizia que os dados que existiam eram insuficientes para se fazer “uma adequada caracterização das qualificações, remunerações e horas de trabalho dos funcionários públicos”.
Com esta constatação ficou o compromisso de que seria feito um recenseamento para mudar a situação. Não sei se houve desenvolvimentos, mas espero bem que sim.
Porque é preciso saber, sem elementos de pressão para cortes rápidos, quando fazem o quê e a que preço e o que é que queremos mudar. E esta é uma excelente altura para o fazer.
*Jornalista