A poucos meses de assinalar o 7.º aniversário, a Academia Desportiva CCMI já festeja várias conquistas. Qual é o segredo?
O segredo é o trabalho feito nestes sete anos e é a maneira como o fazemos. Começámos com os escalões mais baixos e chegámos ao futebol 11 há cinco épocas. No concelho há muitos clubes com futebol, sabíamos que ia ser difícil mas a nossa política sempre foi não recrutar, formar. Os resultados já podiam ter acontecido há mais tempo mas o campeonato foi interrompido por causa da pandemia. Este foi o primeiro ano na honra e fomos campeões distritais com uma equipa financiada com a qual estamos a fazer algumas experiências, tem uma equipa técnica abrangente, coaching desportivo e até análise de desempenho através de equipamentos com GPS. Isso tudo é somado ao esforço dos jogadores.
O que faltava na região para ter nascido a ADCCMI?
Faltava um clube de Leiria, alguém a trabalhar dentro de Leiria. A Academia nasceu dentro do colégio mas o nosso trabalho não se esgota aqui e neste momento mais de metade dos atletas já não são alunos do colégio.
E porquê o futebol?
Porque era o que os nossos filhos queriam (risos). O CCMI tem uma tradição grande de andebol feminino, mas já há clubes a trabalhar muito bem essa modalidade dentro da zona urbana. No futebol encontrámos uma lacuna.
Ponderam outras modalidades?
Sim, temos o projecto a três anos de ter pelo menos duas modalidades de pavilhão. O andebol está muito desenvolvido em Leiria, o futsal tem vindo a fazer um trajecto em crescendo mas há outras modalidades como o vólei que podem surgir.
A direcção é composta por pais dos atletas. Já tinham experiência desportiva?
Somos todos da área da gestão e do marketing. Não pensámos isto como um clube de futebol, mas como gestão para ter uma academia de formação. Queríamos estar dentro de Leiria, conseguimos a parceria porque era impensável sem o apoio do colégio e quisemos os treinadores mais qualificados. Fomos dos primeiros clubes do distrito a ter certificação da federação e o nosso foco sempre foi melhorar: começámos como centro básico, no ano a seguir fomos escola e chegámos a entidade formadora.
Isso é importante?
Vivemos numa sociedade cada vez mais informada, os pais já pensam de uma forma mais racional e menos emocional e procuram um projecto que garanta [LER_MAIS]as melhores condições de treino.
É isso que diferencia a Academia?
Sim. No início alguns pais não compreendiam porque tinham de comprar o equipamento e pagar uma mensalidade porque eles tinham jogado, não pagavam mensalidade nem equipamento e até tinham uma carrinha que os ia buscar a casa. Essa realidade de há 20 anos não é a realidade de hoje. Para sermos um clube certificado temos de ter operacionais com curso de suporte básico de vida presentes em todos os treinos e jogos, um departamento médico, massagista, protocolos de fisioterapia, um gabinete de psico-pedagogia e uma série de recursos associados. Há muito trabalho onde jogar à bola não é só jogar à bola, é muito mais que isso. Temos uma exigência ao nível dos recursos humanos bastante acima dos mínimos e essa aposta reflecte-se.
A Academia tem espaço para todos?
Nunca dispensámos um atleta e isso deixa-me bastante orgulhoso. Por isso é que temos equipa A e equipa B, pode não ser o contexto expectável, mas procuramos uma solução para cada atleta.
Esta época criaram a equipa Sub-23 mas não vão continuar a apostar nos seniores. Porquê?
A nossa participação na distrital de seniores da Associação de Futebol de Leiria (AFL) deve-se à ausência dos campeonatos de Sub-23, como há noutros distritos. Mas 90% do plantel foi estudar para fora e tornou-se bastante difícil. Como o objectivo era reter os jovens na prática, e há projectos de seniores bastante bons na região, na próxima época vamos estabelecer um protocolo com uma equipa sénior para que os atletas que queiram continuar a praticar em Leiria tenham uma solução.
Academia Desportiva CCMI
Fundada em Setembro de 2015, a Academia Desportiva CCMI investiu numa zona desportiva no colégio da Cruz da Areia e recuperou um campo de futebol 11 no Soutocico, Leiria. Actualmente tem 330 atletas federados em futebol, investe em métodos alternativos e acaba de chegar ao patamar nacional com uma das equipas de formação.
No ano em que é Cidade Europeia do Desporto, Leiria é uma ‘ode’ ao desporto?
Leiria não vai passar a dar atenção ao desporto por ser Cidade Europeia do Desporto, mas isto vem dar visibilidade e reconhecer o que os clubes/associações têm feito nas mais diversas modalidades. E pode ser uma oportunidade porque nós temos carências de infra-estruturas desportivas no concelho, como nas modalidades de pavilhão.
O que falta?
Falta uma estratégia e os clubes têm a sua responsabilidade, não podemos atirar sempre as responsabilidades para os políticos. Temos de trabalhar mais em conjunto. Acredito que as coisas acontecem se conseguirmos mostrar a quem toma as decisões que o interesse é ir por determinado caminho e que estamos todos envolvidos no processo. Se assim for, creio que há condições para que as coisas possam evoluir bastante.
Critica a falta de atenção ao desporto, porquê?
Há falta de atenção, falta de informação e nós comunicamos mal porque não temos recursos para tudo. Se eu quiser saber que jogos de futebol existem este fim-de-semana tenho de ir às páginas das redes sociais dos clubes ou à AFL. Não há uma plataforma centralizada com essa informação e o desporto perdeu muito espaço na comunicação social, basta ver o número de páginas que dedicamos ao desporto de uma forma genérica, porque começou a haver um afastamento entre os clubes e a sociedade.
O desporto tem apoios?
Antigamente os clubes financiavam-se de patrocínios de empresas e municipais. Neste momento os clubes só se podem financiar através de parcerias comerciais e do pagamento das mensalidades dos pais porque ter uma actividade desportiva, federada ou não, apoiada em subsídios ou subvenções públicas está completamente fora de questão. Os regulamentos de apoio ao desporto, apesar de acharmos que são sempre poucos, são transparentes e as regras estão bem definidas. Mas claro que precisam de evoluir e não concordamos com algumas, como o PRO Leiria não apoiar a actividade federada de atletas abaixo dos 9 anos porque não defende a especialização precoce. Para nós é um erro, já o manifestámos. Temos 110 atletas abaixo dos 9 anos e nesse sentido não contamos com apoio por parte do município.
Qual é a alternativa?
Às vezes dizemos um bocadinho a brincar que somos os pedintes. Só se dá a volta sem esses apoios tendo os pais a consciência que a colocação numa actividade desportiva tem de ser paga tendo bons parceiros e uma estratégia comercial forte.
Que projectos têm para o futuro?
Eventualmente as modalidades de pavilhão, continuarmos a melhorar as infra-estruturas e as condições de trabalho e lançar a Academia de Treinadores. A próxima época é claramente para consolidar o que está feito.
Que balanço faz destes sete anos?
A nível pessoal é difícil conciliar o tempo que roubamos à família, mas também é gratificante poder fazer parte da felicidade que os atletas vão atingindo. Para a ADCCMI tem sido muito difícil e travamos muitas lutas. O facto de estarmos dentro de Leiria e numa escola não tem só vantagens, apesar de haver uma imagem associada ao nosso clube que isto tem sido muito fácil. Somos pouco conformados com algumas regras implícitas e temos trabalhado um bocadinho para ir mudando as coisas, tanto na AFL como noutros organismos. Começámos a apresentar propostas, a questionar e as coisas têm evoluído o que nos dá motivação para continuar a tentar mudar as coisas, porque há muita coisa no futebol que precisa de mudar. Mas o balanço é muito positivo entre aquilo que temos conseguido face às dificuldades.
O que é preciso mudar no futebol?
A criação de provas femininas, por exemplo. A nossa equipa feminina Sub-15 jogou a época toda contra rapazes em extra-competição porque só agora é que iniciou uma prova em que elas podem participar, e a época está a acabar. No modelo de provas a nível distrital é preciso ver algumas alterações na organização das divisões de honra e distritais. Outro exemplo: no distrito uma equipa Sub-11 joga futebol 5 enquanto no resto do País jogam futebol 7. Temos de perceber que para melhorar temos de apostar em infra-estruturas e condições de treino porque sem conseguirmos mudar este ‘chip’ vai ser muito difícil. É esta a visão e a estratégia que temos desde o início: condições, condições, condições.
A direcção é composta por pais de alunos do colégio, como será quando os filhos saírem da escola?
A ADCCMI é uma associação desportiva que tem estatutos aprovados, independentes, sem fins lucrativos, temos eleições, o mandato da direcção que eu lidero termina em 2024 e a maioria dos alunos não são do colégio. Mas neste momento sinto que, com o grupo de directores que temos, se tiver de sair há uma continuidade que está garantida.
Perfil
De comercial a dirigente desportivo
Renato Cruz, de 43 anos, é comercial, deputado municipal e representante da Assembleia no Concelho Municipal de Desporto. Natural da Benedita, Alcobaça, vive há vários anos em Leiria e é pai do Tomás, um dos jovens atletas que motivou a criação da Academia Desportiva da qual é fundador e presidente.