“Vivemos tempos conturbados, há uma instabilidade política tremenda, há fronteiras a serem redefinidas e cidades a serem transformadas…
Aprendemos recentemente que conflito, em teatro, significa acção.….
Em momentos como este, podemos provocar o pensamento e ter uma acção maior.”
Coletivo depA
O método é mais transversal do que a linguagem” diz o colectivo depA, curador da representação portuguesa na Bienal de Arquitectura de Veneza 2020, cujo tema é Como vamos viver juntos” (How will we live together).
Desde logo, viver com o outro implica ouvir o outro e concessões mútuas no sentido de encontrar denominadores comuns que se constroem pela fundamentação.
Equidade, empatia, durabilidade, sustentabilidade são palavras que entraram no nosso léxico quotidiano, cuja substância importa que integrem o método.
Assistimos neste momento a uma epidemia, coronavírus, que começou por ser um surto.
Penso que aceitamos todos que é um problema global, mas que depende claramente de questões locais, desde logo do seu epicentro em Wuhan, na China.
A sua contenção local, num mundo em permanente movimento, é indissociável de uma acção global e colaborativa. Basta que um de nós não colabore e aceite o seu método para que todos estejamos em perigo.
As diferentes epidemias que conhecemos ao longo da história, peste negra na Idade Média, pneumónica no início do século XX, dizimaram mais de metade da população europeia.
Ambas, devastado que estava o território europeu, suas cidades e reduzidos os seus habitantes, obrigaram a acções concertadas de todos, de forma a conter a sua expansão e a sua não repetição.
A pneumónica mais próxima de nós no tempo acontece em época de rupturas territoriais, consequente do êxodo rural para as cidades, onde as indústrias se implantavam, os centros históricos decaíam e a população se amontoava, num processo desregrado de iniciativa individual, cujo único intuito era o lucro.
As precárias condições em que vivia a maioria da população foram o caminho mais fértil para o rápido contágio que chegou a todos, ricos e pobres.
As primeiras regras urbanísticas modernas foram-no e são de origem sanitária.
O que atrás referi foram contaminações ruidosas.
Assistimos hoje a contaminações mais silenciosas, no sentido em que não as assumimos como uma urgência na acção, mas não menos perniciosas.
A centralização das questões no indivíduo, a par do lucro rápido e fácil, sem ideia da sua pertença a um colectivo e de uma estratégia que seja a resposta às questões que nos unem, é território fértil para epidemias silenciosas.
As aglomerações, maioritariamente cidades, revelam dissociação dos mínimos funcionais urbanos, habitamos num sítio, trabalhamos noutro, recriamos noutro, circulamos sempre de forma individual, em particular carro, comemos e respiramos o que não sabemos, somos agredidos pelo seu ruído que não permite o descanso, desflorestámos, à volta e dentro, ocupámos e contaminámos linhas de água e essencialmente deixámos de nos ouvir, falar e concertar com os outros.
Urge mobilizar os territórios pela participação de todos, através do debate e do diálogo, permitindo elaborar as preferências e as escolhas colectivas de forma a revelar uma perspectiva de corresponsabilidade.