Preparam-se durante anos para conquistar uma condição física e técnica que alcance recordes e títulos nas categorias que disputam. As semanas são preenchidas com treinos e os fins-de-semana dedicados a competições, numa corrida onde a dedicação e o sacrifício são justificados com o amor ao que se faz. Numa competição onde todos querem ser mais e melhor, a pandemia transformou- se numa batalha difícil de vencer. Depois dos confinamentos e do cancelamento de competições, há jovens atletas da região que ainda lutam por ultrapassar as mazelas do vírus.
“Não é fácil, nunca o foi”
O levantamento das restrições pode dar a sensação de que a pandemia já é coisa do passado, mas continua presente no percurso desportivo de muitos atletas. E quem o garante é Carlos Malaquias que já esteve infectado duas vezes e ainda tem sintomas.
“Perdi alguma força e fiquei com bastantes dificuldades respiratórias”, conta o jovem de 20 anos que lida com “mais fadiga e menos resistência” há mais de dois meses. “E nunca mais melhorei a minha marca”, lamenta.
A praticar lançamento do peso há oito anos e a treinar quase todos os dias para conquistar o título de campeão nacional, conta que a solução tem sido “treinar, treinar, treinar, e esperar”. “Neste momento faz tudo parte, não é fácil, nunca o foi”, conclui.
Frustração e dúvidas no processo
Tiago Gonçalves, de 19 anos, é asmático e durante várias semanas carregou consigo o peso do vírus de Covid-19 nos treinos diários. “Senti uma dificuldade enorme em respirar e uma diminuição do rendimento”, conta o atleta que trocou a natação por pentatlo moderno há uma década.
“Sem certeza” de que os sintomas já tenham desaparecido totalmente, assume que “é uma fase difícil” e “treinar é um bocado penoso quando até o peito dói ao correr”.
“Fiquei com uma ligeira frustração e dúvidas sobre quanto tempo demoraria a voltar à forma anterior”, acrescenta, realçando a luta que vence com “muita paciência” e “a redução do volume e do ritmo dos treinos”. Mas, garante, “só o futuro dirá” se a pandemia deixa marcas neste percurso.
A resiliência e a força do desporto
Empenhada em meio fundo, umas das disciplinas do atletismo, aos 18 anos Joana Duarte treina diariamente para competir. Conheceu o peso da pandemia enquanto atleta mas está confiante no futuro. Depois de ter Covid-19, no início do ano, ficou com “falta de ar, muito cansaço e uma recuperação muscular mais lenta” durante mais de um mês e ainda hoje acusa “sintomas que estão a desaparecer de forma mais progressiva”. À “frustração por ter que lidar com isto ao fim de dois anos de confinamentos e sentir o nível competitivo afectado”, acrescentou uma dose de “confiança de que com trabalho ainda é possível” alcançar o campeonato nacional e bater o recorde pessoal. O foco, confidencia, está em “controlar o que se consegue e cumprir os treinos”.
“Isto está a dar-me outra noção do que é o desporto, a batalha, os sacrifícios e a disciplina que são necessários para conseguir focar-me e trabalhar no que desejo”, conclui, certa de que depois da pandemia estará “mais preparada tanto física como psicologicamente”.
Acompanhamento e tempo são a solução
“É importante saber esperar e, nesse período, dar ferramentas ao atleta para que possa perceber a importância da espera, monitorizar o treino e fazer alterações para que possa ter uma percepção de esforço melhor e sensações positivas para reforçar a confiança no treino e no futuro”, defende o treinador Abílio Ferreira.
Depois de aplicar este processo com atletas de atletismo e pentatlo moderno, alerta no entanto que “parece fácil, mas não é” porque “há reacções diferentes”. “Alguns ficam francamente assustados com o processo porque, de repente, deixam de conseguir fazer o que faziam regularmente e pode haver necessidade de recorrer a especialistas”, acrescenta.
Para o médico João André é importante “manter a vigilância apertada”. “É fundamental estar atento aos sinais de alerta: dor torácica após esforço, perda de performance, cansaço fácil, falta de ar, sensação de pernas pesadas”, alerta o especialista, sobre casos em que “é aconselhável parar a actividade temporariamente e realizar um diagnóstico”.