E num ápice passaram dez edições do Festival Gótico Entremuralhas/Extramuralhas. O tempo, de facto, voa. Mas também é o tempo que nos ajuda a perceber, com maior clareza, que o legado mais importante deste singular evento é o seu inegável contributo para a transformação pessoal de muitos e a criação de uma nova realidade colectiva.
É minha convicção que este festival, que ano após ano traz amantes de música dos quatro cantos do mundo a Leiria e à região, também ajudou muitas pessoas “locais” a relacionarem-se com o "novo" e com o "diferente" de forma natural.
Isso ainda é mais significativo e relevante se tivermos em conta que Leiria tinha, até há poucos anos, o "estigma" de ser uma cidade demasiado conservadora.
Embora aqui e ali ainda haja pequenos resquícios de alguma resistência, sobretudo devido à ignorância e ao desconhecimento do evento em si e [LER_MAIS] sobre as pessoas que o frequentam, parece-me por de mais evidente que o nosso festival contribuiu para criar o paradigma de uma Leiria vanguardista, tolerante, inventiva, estética, arrojada, participativa e com uma saudável margem de irreverência.
Ainda assim, há quem não se reveja em tudo isto e queira interceder a desfavor. Lembremos, por exemplo, no ano passado, o lamentável episódio protagonizado pelas “forças ocultas” de um clero que não mostrou o rosto mas que foi suficientemente poderoso para “impedir” a organização de utilizar, como estava previamente programado, o palco da Igreja da Misericórdia – local dessacralizado e transformado em Centro de Diálogo Intercultural de Leiria.
Porém, quis o destino e um conjunto de homens e instituições com visão, que um ano depois o festival estreasse, com desmesurado sucesso, um palco no Mosteiro da Batalha – Património Mundial da UNESCO.
A afluência ao concerto dos italianos Ashram naquele local de sonho, superou em largo número as nossas melhores estimativas e acabou por dar o mote ao que viria a acontecer no resto do evento, cuja edição teve o maior número de espectadores de sempre. Isso deixa-nos felizes, mas não nos tira os pés do chão.
A qualidade dos intervenientes, o arrojo programático e a blindagem do festival dentro do seu arquétipo seminal (Música, Arquitectura, Património) continuarão a ser o nosso compromisso de honra e o orgulho maior deste nosso evento ímpar.
Presidente da Fade In