Na vida como num texto, a página em branco. Uma e outra vez e – por esta altura, já sei – as vezes que forem necessárias.
Na vida como num texto, mete respeito a página em branco. Ao mesmo tempo assustadora e auspiciosa, na mesma medida solitária e espalhafatosa.
Num texto como na vida, pouco importam as palavras ditas ou as aventuras prometidas. Imaginadas e contruídas com a melhor das convicções.
Ainda que a contragosto, pouco se demoram as conquistas e as vitórias, os amores e as ambições. Não. Por esta altura, já sei que viver dá luta, escrever também.
Chego a suspeitar que façam parte conjunta de um plano maior do que eu. Na escrita como na vida, quando é para começar de novo, é para começar de novo. Com algum talento, perceber a tempo que há heróis que não servem as missões que lhes confiámos. Histórias que jamais terminariam da forma que idealizámos, se ao menos estivéssemos mais atentos.
Mais comprometidos. Menos cheios de nós.
É perceber que há trabalhos que jamais serão odisseias e que há caminhos que não levam a lugar nenhum.
Na vida como num texto, a página em branco é recorrente. Insistente. Obstinada. Um refazer de histórias possíveis que nunca aceitará um conflito menor do que nós. Por esta altura, já sei, não é possível existir em irresponsável complacência.
Não chega querer sem verdadeiramente conquistar. [LER_MAIS] Não chega imaginar. Não chega existir. Viver é como escrever.
Estamos só e apenas a falar de histórias. Umas mais felizes, mais exigentes, outras menos.Umas mais interessantes, outras menos.
No fundo, na vida como num texto, estaremos sempre sozinhos e entregues a nós próprios perante uma página em branco. Mas nesse momento, por mais assustador que seja, a imensa responsabilidade de querer fazer de uma paixão, um romance.
De um conflito, um sucesso. De uma história, um clássico. Da nossa vida, uma personagem maior.
De entre todas as nossas diferenças, o dever de criar uma história a sério é a única coisa que nos une. Basta apenas uma coragem do caraças. Se ainda assim der para o torto, começar de novo.
Com sorte, conseguir voltar a uma página em branco. Devidamente limpa e de novo disposta. Na vida como num texto.
*Pessoa criadora de conteúdos