O encerramento da marca de confecções onde trabalhavam, em Março de 2022, lançou Jéssica João, designer, Anabela Jordão da Silva, modista, e Vanessa Neves, especialista em modelagem e corte, para um cenário de incerteza, mas a alternativa encontrada foi audaz. Abriram a Voil Gallery, o seu próprio atelier de alfaiataria, na rua D. João Pereira Venâncio, em Leiria, apostando no feito à medida (bespoke).
Inicialmente focadas no vestuário feminino, nomeadamente fatos e peças ajustadas, abriram horizontes quando lhes foi feito um pedido para criar um fato de homem. “Revelou-se um desafio maior do que o esperado. Achávamos que era muito fácil, que íamos conseguir, mas não ficámos satisfeitas com o resultado”, recorda Jéssica João.
A noção de que precisavam de um mestre alfaiate tornou-se clara. A busca por alguém com o conhecimento necessário foi árdua, até que lhes falaram de Jorge Cardoso, um nome com anos de experiência[LER_MAIS] na Unifato, atualmente Outfi 21. Durante esse primeiro contacto, explicaram que era necessário o fato em 15 dias. A resposta de Jorge foi pragmática: “Não vão conseguir fazer um fato em 15 dias.” Explicou -lhes a complexidade da alfaiataria masculina, mas comprometeu-se em ensinar todos os segredos que havia aprendido desde que, aos 11 anos, enfiara uma linha na agulha, pela primeira vez.
A diferença entre o corte masculino dos casacos, que privilegia uma forma mais recta, e o feminino, com as suas curvas mais acentuadas, foi um dos primeiros ensinamentos. Apesar dos processos serem semelhantes, a construção e a modelagem exigem abordagens distintas. Jorge Cardoso tornou-se no “mestre Jorge” e partilhou o seu conhecimento. “Fez-me escrever e apontar tudo, tirar fotos a tudo. Fiz um documento com vídeos, fotos, anotações de como é que se faz o casaco do início ao fim”, recorda Jéssica João.
Como Jorge previra, o fato encomendado que motivou o encontro dos quatro não foi entregue. “O casaco tinha um valor do tecido tão elevado, que ele disse que era um risco estarmos a pegar um tecido daqueles.” A ética e o respeito pelas marcas de luxo que representam, como a Ermenegildo Zegna e a exclusiva Scabal, com tecidos que chegam aos 700 euros o metro, são invioláveis.
Nos últimos tempos, a Voil Gallery conquistou uma clientela diversificada e exigente, que vai desde bancários, médicos e empresários e até uma juíza com gosto requintado que veste os fatos do atelier nas salas de audiência. Recentemente, a marca captou a atenção da revista NIT com um casaco verde em tecido Scabal, com botões em aço feitos à mão da Holland & Sherry, num trabalho que exemplifica a dedicação ao detalhe e à qualidade.
Outro momento que a equipa destaca foi a presença na Pitti Uomo, uma das maiores feiras de alfaiataria do mundo, em Janeiro, testemunho do reconhecimento crescente do seu trabalho. Infelizmente, as três fundadoras deixaram de poder partilhar as notícias do seu sucesso com o mestre que faleceu na semana passada, vítima de doença súbita.